quinta-feira, 2 de julho de 2009

Ler Matéria - Revista RIE

Transcendência nas manifestações anímicas e espíritas
Cairbar Schutel

Publicado na RIE em agosto de 1931

Todas as manifestações das irrevogáveis leis que regem o Universo têm um fim mais providencial e, portanto, transcendental, do que os homens julgam na sua ignorância de encarar tais fenômenos.
Desde a queda de uma fruta ao balançar-se dos astros que denunciam a gravitação dos corpos, desde as contrações da rã observadas por Galvani à eletricidade estática, da chispa que ressalta da pedra ferida pelo fuzil às mais apuradas vibrações da luz, espargindo ondas multicores que desaparecem no éter, todos esses efeitos são de transcendente natureza, transcendência essa que vai desaparecendo à medida que, pelo estudo e observação, remontamos à causa determinante de tais manifestações.
O mundo está cheio de mistérios e a ignorância humana se embala e adormece placidamente, como a criança, nessa rede misteriosa, numa perene abstração da Verdade.
Não fosse assim não haveriam próceres nem gênios, inventores e descobridores que, à semelhança de condutores de rebanho, estercam com suas descobertas e novas verdades a humanidade, sempre retardatária para as veredas do bem e do progresso.
Assim tem sido em todos os tempos do mundo, assim tem acontecido a todas as gerações.
O homem só caminha fustigado pela Verdade, e quando a Verdade cessa temporariamente a sua ação, como que para observar a aptidão humana na conquista de mais elevados planos, o homem se perturba, desequilibra-se e querendo voltar ao passado por não encontrar a estrada do futuro, transvia-se e perde-se num emaranhado, só daí saindo à custa de grandes sacrifícios dos obreiros do progresso, vigilantes e sempre solícitos a nos fazerem galgar novos estágios de vida, novos conhecimentos indispensáveis aos surtos promissores de espiritualidade.
A este propósito vem à tona os princípios espíritas, cujos fatos se têm verificado em todos os tempos, desde que o mundo é mundo. Todas as Bíblias e Escrituras das mais remotas eras se erguem com os seus princípios de filosofia e de moral sobre esses estranhos fenômenos em todos os tempos, também de ordem transcendental, devido à ignorância dos povos e em justa razão do seu progresso religioso e cientifico, tendente sempre a uma evolução gradativa, mas perpétua, como se vem observando AB-INITIO até a época em que nos achamos, promissora de grandes deslumbramentos.
Com efeito, a Missão Espírita sob todos os pontos de vista ultrapassa, com o seu nítido e luminoso programa imortalista, todas as filosofias e todas as religiões, sendo a única capaz de aniquilar para sempre o terrível Dragão que estende as suas garras pelo mundo todo: o Materialismo.
Explicando os Fenômenos Psíquicos, oriundos de ações anímicas, sejam aquelas que têm por causa as manifestações dos vivos, sejam as que têm por causa a manifestação dos mortos, o Espiritismo veio fazer uma grande revolução na Ciência, até aqui materialista, assim como já começou a operar uma renovação completa na Religião, até aqui também dogmática, sacerdotal, mercenária.
Fazendo da Religião um conhecimento científico, e da Ciência um monumento verdadeiramente moral, o Espiritismo se destina a reformar o mundo, não por meio de leis opressoras, mas convidando todos ao estudo, à pesquisa e à meditação e sob as condições de um racionalismo criterioso e lógico.
Encontrada a chave dos grandes problemas que obumbravam as massas e constituíram a preocupação dos mais afamados filósofos de todas as eras, Allan Kardec, o douto lionês, cujo Espírito Missionário é inexcedível em clareza, em concisão, reuniu, em seis magníficos volumes, uma Obra que serve de base a mil outras espalhadas pelo mundo inteiro, proclamando a Nova Fé, e ao mesmo tempo pondo em alvoroço todas as ciências que julgavam haver dito a última palavra: física, química, biologia, patologia etc, etc, até mesmo a astronomia, cognominada a mãe ou a rainha das Ciências.
Ao mesmo tempo que essa nova vibração de luz se fazia, derruindo de uma vez o castelo Materialista considerado inexpugnável, com aquela lógica e clareza de que era dotado o grande condor do pensamento, afastava das inteligências o milagre e o sobrenatural resultantes da ignorância dos homens passados e dava mais uma grande avançada nas esferas transcendentais, vedadas então pelo espírito conservador das tradições ancestrais.
Foi justamente esta a maior glória de Allan Kardec; mais do que Colombo, o gigante da inteligência atravessou as barreiras do túmulo, devassou o “sobrenatural”, desarvorou o “mistério” e nos pôs em relação com o “transcendental”, resolvendo a grande equação cuja incógnita assombrava as massas e havia consumido laboriosa tarefa dos maiores pensadores antigos e contemporâneos.
Só essa visão nítida do hercúleo Missionário seria bastante para consagrá-lo como, após Jesus Cristo, o Maior de todos os Espíritos que têm baixado à Terra.
Não há dúvida que os inscientes dos princípios espíritas consideram todos esses fenômenos de ordem transcendental, vendo-os como o X da equação que só um futuro remoto poderá resolver. Mas é preciso que se note que esses indivíduos não se preocupam com a parte filosófica dos fenômenos, chegam mesmo a afirmar a sua ignorância a esse respeito, pretendendo que um dia a ciência resolverá o problema de acordo com as leis físicas ainda desconhecidas e sendo a sua causa meramente física, porque, segundo pensam, não pode haver alma, no sentido verdadeiro da palavra, não sendo esta senão uma resultante de forças que agem e se dispersam, um produto, por exemplo, de funções nêuricas e cerebrais.
Esse erro milenar que vem se eternizando é a causa da degradação em que se acha o nosso mundo, imerso na negação, no obstinado materialismo dos sábios, de preconceitas ideias e vetustos dogmas que impedem a ascensão da ciência para a luz e para a verdade.
São estes que, de braços dados com o sacerdotalismo, incensam o maravilhoso e o transcendental, entravando o estudo do Espiritismo e inventando uma terminologia complicada para batizar os seus fenômenos.
Trabalhemos, entretanto, sem esmorecer, certos de afastar dos estudiosos o “temor dos sábios”, pois grandes surpresas nos estão reservadas e, talvez, mais cedo do que esperamos, o grande Ideal erguer-se-á majestoso e belo, confundindo os que se comprazem na cômoda expectativa do tempo resolver todos os problemas.
A Missão Espírita vai acentuar o seu labor e o douto Missionário lionês aparecerá como o indispensável Guia dos povos, apontando-lhes o norte da Vida; então verão que a transcendência das manifestações anímicas e espíritas não consistem noutra coisa que no erguimento do Amor como Religião Natural, e na demonstração da existência e sobrevivência do Espírito, chave de todos os problemas que ensombram a humanidade atual.

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