sábado, 28 de julho de 2012

Um conto reencarnacionista em Platão


Da Redação



A reencarnação – crença na qual o espírito de um morto pode ter uma nova existência em um novo corpo físico – era ensinada na antiga Grécia pelos seguidores do culto de Orfeu e de Pitágoras.

O filósofo ateniense Platão, que viveu no séc. IV a. C., no período clássico da Grécia, trata do assunto em um conto no livro A República. Aqui traz várias revelações sobre a vida após a morte e a reencarnação, dentre as quais destacamos uma sobre a escolha de uma nova vida, comparando-a com os ensinamentos espíritas sobre o assunto.
Platão, nesse livro, reproduz um conto narrado pelo filósofo Sócrates para os seus discípulos. No conto, Er, o filho de Armenius, foi dado como morto em batalha e levado para casa para ser enterrado. No décimo segundo dia, estando na pira funerária, ele recupera os sentidos e conta para os seus conterrâneos que tinha estado no mundo dos espíritos e recebido a missão de observar esse mundo e revelar para as pessoas o que acontecia após a morte.
Er descreve o começo do processo de reencarnação de um grupo de espíritos. Eles podiam escolher o tipo de vida que gostariam de ter em uma nova existência, dentre as várias opções postas à sua disposição. Um profeta avisava-os de que “O primeiro a quem a sorte couber, seja o primeiro a escolher uma vida a que ficará ligado pela necessidade. (…) A responsabilidade é de quem escolhe. O deus é isento de culpa”.(1)
Adiante, Er discute os tipos de vida que os espíritos podiam escolher. Descreve o seguinte: “a maior parte fazia a sua opção de acordo com os hábitos da vida anterior. Dizia ele que vira a alma que outrora pertencera a Orfeu escolher uma vida de cisne, por ódio à raça das mulheres, porque, devido a ter sofrido a morte às mãos delas, não queria nascer de uma mulher; (...) A seguir a esta, era a (alma) de Agamenon. Também ela, por ódio à raça humana, devido ao que padecera, quis mudar para uma vida de águia.
Depois, a alma de Ulisses, a quem a sorte reservara ser a última de todas, avançou para escolher, mas, lembrada dos anteriores trabalhos, quis descansar da ambição, e andou em volta a procurar, durante muito tempo, a vida de um particular tranquilo; descobriu-a a custo,jazente em qualquer canto, e desprezada pelos outros; ao vê-la, declarou que faria o mesmo se lhe tivesse cabido o primeiro lugar, e pegou-lhe alegremente” (1).
A reencarnação, uma das bases do Espiritismo, foi revelada pelos espíritos superiores através de vários médiuns a Allan Kardec na primeira metade do século XIX. Eles ensinaram que os “Espíritos não ocupam perpetuamente a mesma categoria. Todos se melhoram passando pelos diferentes graus da hierarquia espírita. Esta melhora se efetua por meio da encarnação, que é imposta a uns como expiação, a outros, como missão.
A vida material é uma prova que lhes cumpre sofrer repetidamente, até que hajam atingido a absoluta perfeição moral.(...) Tendo o Espírito que passar por muitas encarnações, segue-se que todos nós temos tido muitas existências e que teremos ainda outras, mais ou menos aperfeiçoadas, quer na Terra, quer em outros mundos” (2).
Diferentemente do descrito no conto, em que o espírito pega um número jogado junto dele por sorte e que permite aos primeiros colocados o privilégio de escolherem, antes dos outros, as melhores amostras de vida colocadas no chão, sem levar em consideração os méritos; o Espiritismo descreve com mais detalhes como ocorre o processo de programação de uma nova existência.
A programação sofre diversas influências. Por exemplo, os traumas psíquicos sofridos em outra existência podem afetar a escolha de uma nova vida, conforme aconteceu com Orfeu e Agamenon. A busca de novas experiências pelo espírito é outra motivação, conforme o caso de Ulisses, que, após ser rei de Ítaca, procurou uma vida de pessoa comum.
Ao contrário das crenças gregas, o Espiritismo não aceita que um homem com consciência de si mesmo e desenvolvido intelectualmente reencarne no corpo de um animal, como um cisne ou águia, como pretendiam Orfeu e Agamenon. Em O Livro dos Espíritos, Kardec expõe que os espíritos rejeitam, e explicam porque “de maneira absoluta, a ideia da transmigração da alma do homem para os animais e reciprocamente”.(3)
O espírito André Luiz, na psicografia de Chico Xavier, traz relatos detalhados de como se processa a reencarnação de espíritos. Ele descreve o processo de escolha de um novo corpo, a ambientação do reencarnante com os futuros pais, a perturbação que antecede a reencarnação, o desenvolvimento do feto e o nascimento.
O conto de Er mostra que os gregos antigos já estavam preocupados em saber como é a vida após a morte, como o espírito sobrevive, mantendo a sua individualidade, como as boas e más ações influenciam no além-tumulo, como escolhem uma nova vida e reencarnam.
Essas preocupações ainda fazem parte da cogitação de milhões de pessoas gerando dúvidas angustiantes e perquirições dolorosas. Esclarecer essas e outras questões sobre a vida após a morte, instruindo e consolando é um dos objetivos do Espiritismo.



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Bibliografia
The Online Library of Liberty – BOOK X. - Plato, Dialogues, vol. 3 - Republic, Timaeus, Critias [1892] - http://oll.libertyfund.org/?option=com_staticxt&staticfile=show.php%3Ftitle=767&chapter=93816&layout=html&Itemid=27
The Republic, http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=10970
(1) A República, Platão, Martin Claret, páginas 313 a 319
(2) O Livro dos Espíritos, Introdução, VI
(3) O Livro dos Espíritos, cap. V, item 222

Caixa de Cartas



Marcus Vinicius de Azevedo Braga



Em mais uma de minhas muitas mudanças de residência, na rotina de encaixotamento das coisas em meio à poeira, encontro uma antiga caixa de sapatos, amarrada com barbante, morada de antigas fotos, cartões, desenhos, manuscritos e cartas, presentes de amigos de outrora.
Mexo nas cartas, algumas escritas com canetas de diferentes cores, outras com desenhos, cheiros e adesivos. Lembranças carinhosas de amigos oriundas de encontros espíritas, tardes fraternas, manhãs fraternas, dias fraternos... Graças a Deus, temos muita fraternidade no Movimento espírita.
São folhas de papel que ainda guardam em si grande sentimento.Hoje ninguém mais escreve cartas. Replicamos, copiamos e colamos, curtimos, encaminhamos a nossa lista. Abro a caixa de correios diariamente e só encontro faturas, publicidade e contas. Esquecemos o prazer de escrever aos amigos.
Olhando essas cartas, guardadas naquela antiga e empoeirada caixa de sapatos, reflito sobre a importância da amizade, e mais ainda, da necessidade permanente de se cultivar os amigos, pela vivência e pela lembrança, mesmo que seja por uma singela carta.
Amigos são um tesouro. Alguns vão, outros vem. Alguns ainda reaparecem! Nos momentos de alegria, celebram. Nos momentos difíceis, consolam. Como é bom ter amigos para conversar, abraçar, se divertir e ainda, mandar cartas. Como dizia a música dos tempos da juventude espírita, o companheiro de jornada é uma “dádiva dos céus”.
Mandam-nos cartas os amigos espirituais, falando da vida do lado de lá, consolando e esclarecendo, pela magia das palavras quês e perpetuam pela psicografia. Não esquecem de nós, ainda que não sejam percebidos, velando, de forma perene, por nossa encarnação.
Toda essa reflexão vem à mente à medida que mexo naquela caixa de cartas. São cartas antigas, manuscritas, alguns cartões. Representações de sentimentos dos meus próximos, agora distantes. A amizade é uma força poderosa, mas que precisa ser cultivada.
O movimento espírita, como não poderia deixar de ser, é celeiro de grandes amizades, de ambos os planos da vida, que merecem ser regadas pela nossa atenção, como visgo que dá liga a esse movimento e como combustível que alimenta a chama desses grandes momentos que vivenciamos na seara espírita, sempre como bons amigos, como bons irmãos.

domingo, 22 de julho de 2012

O Alcoolismo


Um minuto com Chico Xavier
Ano 6 - N° 270 - 22 de Julho de 2012
JOSÉ ANTÔNIO VIEIRA DE PAULAdepaulajoseantonio@gmail.com
Cambé, Paraná (Brasil)


 
O alcoolismo é uma enfermidade de profundo interesse para sociedade terrena, uma vez que raras são as famílias que não tenham em seu reduto alguém, próximo ou distante, portador de tal mal.
A ciência procura de toda forma encontrar mecanismos para seu tratamento sem que tenha tido sucesso absoluto.
A verdade é que o alcoolismo, mesmo que causado por fatores genéticos ou intrínsecos, sempre será uma doença de cunho espiritual, pois que traz sua raiz nos refolhos da alma errante ao longo de várias encarnações. E, também, é um mal agravado pela presença desgastante de Espíritos homiziados com tal hábito. Pode ser um hábito adquirido em épocas de sofrimentos intensos, após quedas morais delicadas, ou mesmo um processo de vingança espiritual patrocinado por Espíritos infelizes que, por terem sofrido nas mãos de déspotas do passado, escravagistas e tais, buscam a vingança.
Seja qual seja a causa, o tratamento exige a participação do próprio enfermo, de sua família e um auxílio firme da espiritualidade superior que, por ter autoridade moral sobre os Espíritos inferiores, buscam, com a ação do amor, sensibilizá-los, a fim de demovê-los desse intento, processo esse que também pode demorar, porque os benfeitores nada impõem e dependem muito da transformação moral do doente. É verdade que, também por caridade, esses benfeitores podem afastar de forma mais imediata uma entidade viciada, mas, como ensina o mestre lionês Allan Kardec, é preciso remover a causa, isto é, tratar o enfermo.
Jesus, nosso mestre maior, também se referiu ao afastamento de entidades malévolas dizendo que, quando um espírito imundo deixa um lugar, ele, não encontrando repouso, busca outros sete piores que ele e volta ao ataque.
Portanto, o alcoolismo deve ser visto como uma enfermidade espiritual, cuja classificação pode ser encontrada entre as obsessões, particularmente aquela a que Allan Kardec se referiu como subjugação, que é quando a vontade de alguém está sob o domínio de outrem.
No texto sobre a vida Chico que apresentaremos, retirado do livro “O Prisioneiro de Cristo”, de R. A. Ranieri, publicado pela Editora LAKE, veremos importante exemplo sobre o tema em análise.
Segue o texto:
“Nós estávamos encostados na porta que dá para o gabinete de receitas. Chico ia atendendo o povo e conversando conosco nos intervalos ou no espaço que mediava entre uma e outra pessoa. Às vezes contava uma história para ilustrar a oportunidade.
- Sabe, Ranieri – dizia ele – quando eu trabalhava no Centro com José Xavier, ia lá um rapaz que bebia muito, mas que desejava deixar de beber. Falou-nos. Começamos a orar e pedir por ele. O rapaz enchia-se de boa vontade e durante a reunião ansiava se libertar, mas saía dali e tornava a beber. Nós insistíamos nas orações.
Um dia, Emmanuel me disse: ‘Você, Chico, vai acompanhá-lo quando sair daqui e verá o que ocorre com ele’. Assim fiz. Dilatou-se-me a vidência e passei não só a acompanhá-lo no plano físico como também a vê-lo no campo espiritual. Assim que saiu, na porta do Centro esperavam-no quatro entidades inferiores que logo o envolveram e o conduziram para um bar. Enquanto um lhe fazia companhia dentro do bar e absorvia-lhe aspirando a pinga que ele ia bebendo, os outros três montavam guarda. Ele bebia. O primeiro foi lá como dissemos e aspirou toda a bebida. Depois aquele saiu, e foi o segundo. Ele bebeu mais e o segundo absorveu a bebida. Saiu este e foi o terceiro e depois o quarto. Enquanto bebia, os outros três impediam que um quinto Espírito que se  aproximara também bebesse com ele.
O rapaz era propriedade dos quatro Espíritos, era deles, pertencia-lhes.
Olhei o Chico e compreendi-lhe a lição.
Isto queria dizer que também no mundo espiritual, assim como na Terra, há os insaciáveis, os dominadores da alma humana, que aprisionam e escravizam a criatura da mesma forma ou pior que os gângsteres americanos que aparecem no cinema. Krishna ensinava que existe uma luta terrível travada entre o Bem e o Mal.” 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Frase do Dia


Lembra-te de que a Força divina sabe ver nas profundezas e, com o arado do tempo,
tudo corrige, reajusta e eleva,
sem necessidade da nossa apreciação individual.


Emmanuel

terça-feira, 17 de julho de 2012

O Bem em ação!



173
COMO TESTEMUNHAR
       “Mas recebereis o poder do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis testemunhas, tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da Terra.” — (ATOS, CAPÍTULO 1, VERSÍCULO 8.)
       Realmente, Jesus é o Salvador do Mundo, mas não libertará a Terra do império do mal, sem a contribuição daqueles que lhe procuram os recursos salvadores.
       O Divino Mestre, portanto, precisa de auxiliares com atribuições de prepostos e testemunhas, em toda parte.
       É impraticável o aprimoramento das almas, sem educação, e a educação exige legiões de cooperadores.
       Contudo, para desempenharmos a tarefa de representantes do Senhor, na obra sublime de elevação, não basta o título externo, com vistas à escola religiosa.
Indispensável é a obtenção de bênçãos do Alto, por intermédio da execução de nossos deveres, por mais difíceis e dolorosos.
Até agora, conhecemos à saciedade, na Terra, o poder de dominar, governar, recusar e ferir, de fácil acesso no campo da vida.
Raras criaturas, porém, fazem por merecer de Jesus o poder celeste de obedecer, ensinando, de amar, construindo para o bem, de esperar, trabalhando, de ajudar desinteressadamente. Sem a recepção de semelhantes recursos, que nos identificam com o Trabalhador Divino, e sem as possibilidades de refleti-Lo para o próximo, em espírito e verdade, através do nosso esforço constante de aplicação pessoal do Evangelho, podemos personificar excelentes pregadores, brilhantes literatos ou notáveis simpatizantes da doutrina cristã, mas não testemunhas d'Ele.
Autor: Oscar Spessoto.

Outra Bela História de Amália Domingos Soler!


 O MENINO JESUS
          Um dos quadros mais belos que a Natureza apresenta ao homem que pensa: uma criança nos braços de sua mãezinha.
          Nunca esquecerei um pequenino que contará dois anos: sua cabecinha está coberta por dourados e sedosos cabelos, seu rosto é muito simpático, e seu olhar tão expressivo que não vi outros olhos que revelem a felicidade como os olhinhos desta criança.
          Quer muito bem à sua mãe e, uma tarde, diante de mim, conseguiu sentar-se em seu regaço, todo encolhidinho, reclinando a cabeça sobre o peito daquela que o carregou em suas entranhas.
          Suas faces pálidas adquiriram a suave cor das rosas; em sua boquinha se desenhou o mais doce sorriso e seus olhos irradiaram um prazer imenso.
          Sua jovem mãe olhava-o sorrindo, como só as mães sabem sorrir.
          Eu que, como o nobre russo do conto, vou pelo mundo à procura de um homem feliz, senti-me tão atraída pela expressividade daquele quadro, que não podia dele desviar meus olhos: queria fotografar em minha mente aquele admirável grupo, em especial o rosto do menino, expressivo e sorridente sob todos os aspectos.
          O menino observou que eu olhava fixamente: contente e risonho, escondia sua ruiva cabecinha no regaço maternal, e logo voltava a olhar-me como dizendo, com seu sorriso:
          "Sim, sim, sou feliz; a felicidade existe na Terra". E repetia suas carícias, mas tão graciosamente, que sua mãe o cobria de beijos, ao mesmo tempo que murmurava:
          - Não vês quão belo é meu filho?
          - Oh sim, é muito belo! Eis aqui um menino-Jesus mais belo do que todos os que vi nos quadros dos pintores místicos. Grande é a arte, mas a Natureza é maior ainda.
          E continuei olhando a criança para recordar, em minhas horas de amargo desencanto, aquele quadro encantador da felicidade humana, reflexo, sem dúvida, da felicidade inefável que se deve fruir em outros mundos melhores.
          No olhar daquele pequerrucho, não havia somente essa inocência infantil, essa alegria simples peculiar de quase todas as crianças. Não. Havia muito mais: uma expressão inteligente, inexplicável.
          E como o pensamento voa com mais rapidez do que todas as águias, e do que todas as ondas sonoras ou luminosas, aquele menino-Jesus trouxe, à minha mente, a recordação de uma história que não apreciei, em todo o seu valor, antes de conhecer o Espiritismo. Hoje, que comungo esta consoladora doutrina, a recordação daquele fato me comove, e vou contá-la, crendo ser útil ensinamento.
          Conheci Aurora Montejo, jovem de bons sentimentos, mas fechada no cárcere estreito do fanatismo religioso, como se toda a sua família se compusesse de monjas e de frades, como se diz vulgarmente.
          Casaram-na com um primo, mais para somar fortunas do que para enlaçar corações; e um menino veio alegrar, mais tarde, o lar triste e solitário.
          Aurora enlouqueceu de alegria, e rodeou seu filho das mais ternas atenções. Não obstante, seus amorosos cuidados foram inúteis: antes de completar dois anos, o pequenino deixou a Terra e Aurora acreditou morrer de tristeza.
          - Meu Deus! - exclamava -. Que vou fazer, que vai ser de mim sem o meu menino-Jesus... !
          O pequerrucho era tão precioso, tão humilde e tão bom que toda a família lhe dava o nome de Redentor. Vendo Aurora desesperada, um seu irmão lhe disse:
          - Queres encontrar consolo?
          - Diga-me o que devo fazer porque não posso viver assim: até duvido da misericórdia de Deus.
          - Ouça, teu menino-Jesus foi para o céu, mas a imagem do menino perdido se venera em nossa igreja. Encarrega-te de cuidar de um altar do menino-Jesus, e verás como a tua alma se tranquilizará. Teu filho ficará muito feliz contigo e, em sua glória, intercederá com nosso divino Pai, e serás ditosa por sua mediação. Aurora se encarregou, em seguida, de cuidar de um altar do menino perdido, preciosa imagem de rosto encantador e ruiva cabeleira, que vestiu com uma túnica de seda de prata bordada, com pérolas e diamantes, fazendo construir-lhe uma capela, em cujo altar, diariamente, se celebravam missas, que Aurora ouvia com místico recolhimento.
          Como era imensamente rica, obteve do Papa uma bênção apostólica, e a concessão de quarenta dias de indulgência a todos os fiéis que, diante do altar do menino perdido, rezassem o rosário, às dezoito horas. Aurora dirigia a oração; mas, apesar de toda a sua devoção, quando via um menino da idade do seu, se entristecia e chorava em profundo desconsolo.
          Um dia Aurora veio visitar-me e disse-me:
          Ah, Amália! Acho que vou enlouquecer. Há algumas noites que, ao deitar-me, ouço uma voz que murmura em meu ouvido: "Procura o menino-Jesus".
          Quando entro na capela, por mais procure entregar-me à oração, a mesma voz me perturba dizendo:
          "Não é este o caminho; procure o menino-Jesus em outra parte."
          Tendo me referido a isso ao meu confessor, disse-me que estou sendo perseguida pelos maus espíritos, os quais só poderei afugentar pela penitência. E aqui me tens ignorante do que se passa. A verdade é que, desde a morte de meu filho, não sei o que é ter sossego. Ao ver a imagem rígida e fria do menino-Jesus, recordo meu filho, que era tão carinhoso e brincalhão, e as lágrimas correm pela minha face.
          Passados alguns dias, Aurora voltou a visitar-me, pedindo-me que a acompanhasse, pois deveria ir, por encargo do seu confessor, levar uma coroa à Virgem das Angústias. Acedi prazerosamente. Andamos longo tempo antes de subirmos à carruagem, chegando, por fim, a um desses templos humildes e solitários, que são os mais agradáveis àqueles que vão ao templo para orar.
          O pároco não estava, e o sacristão recebeu o presente. Ao sair da igreja, me chamou a atenção um homem de idade mediana que estava podando um roseiral de trepadeiras: seus olhos avermelhados demonstravam que havia chorado muito, e, em seus menores movimentos, se notava o desfalecimento da dor.
          - O que tem esse infeliz? - perguntei ao sacristão.
          - O que queres que ele tenha senhora, senão penas e misérias. É meu irmão e perdeu a esposa, que era boa mulher, deixando-lhe cinco filhos, cabendo todos debaixo de uma cadeira. Ele está sem trabalho, e como a época é má e não posso ajudá-lo muito, o pobre não sabe como fazer para seguir adiante.
          Aurora, ouvindo falar de crianças, prestou atenção. De pronto a vi empalidecer e estremecer, para depois, olhando por todos os lados como se estivesse assustada, me perguntar em voz baixa:
          - Ouviste?
          - Sim, é uma história triste.
          Não é isso; ouviste o que acabam de me dizer?
          - Não sei do que me falas; refiro-me ao sacristão.
          - Pois bem; enquanto ele falava disseram-me ao ouvido: "Aí está o menino-Jesus, corre em sua procura". Vou ficar louca; quando ouço essa voz não sei o que se passa comigo.
          - Tranquiliza-te e faça uma boa obra, deixando uma esmola a esse infeliz, para que dê pão aos seus filhos.
          Aurora se aproximou do irmão do sacristão e lhe disse:
          - Você mora muito longe?
          - Não, senhora; aqui na esquina.
          - Pois acompanhe-me até sua casa, que quero ver os seus filhos.
          O pobre homem suspirou angustiado, e começou a andar. Chegamos a uma casinha humilde, em cuja porta apareceram cinco crianças, o maior de sete anos, e o menor de dois: três meninas de seis, cinco e quatro anos, brincavam fazendo comidinhas, enquanto o maior recortava gravuras, e o pequenino se entretinha desmontando um cavalo de pau e destroçando um carro de papelão.
          Nada mais linda do que esta última criatura. Parecia um desses anjos que rodeiam a Virgem no ministério da Concepção. Olhos azuis, cabelos dourados, rosto de neve, faces rosadas e lábios vermelhos como o rubi.
          À chegada do pai, abraçou-lhe aos joelhos, o que bastou para que Aurora prorrompesse em pranto copioso. Vendo-a, o pequenino, como se a conhecesse,   pegou-lhe o vestido, enquanto lhe dizia com acento carinhoso:
          "Por que choras? Pobrezinha! Não chores, porque eu te quero bem".
          Aurora tomou-o em seus braços e, enchendo-o de lágrimas e de beijos, perguntou como se chamava.
          - Jesus - respondeu o pequenino.
          - Valha-me Jesus! - replicou Aurora. E, deixando-se cair em uma cadeira, ficou muito tempo pensativa, com o menino nos braços, que ria alegremente, colocando as mãos sob a peça de pele que Aurora vestia.
          As demais crianças a rodearam, olhando-a com inocente curiosidade. Eu contemplava aquele quadro com inefável emoção.
          Aurora, que acabava de tomar sua resolução levantou a cabeça e, dirigindo-se ao irmão do sacristão, disse-lhe:
           - Você muito perdeu com a partida da mãe dos seus filhos, mas a providência de Deus é inesgotável. Perdi meu único filho e, desde que morreu, vivo em angustiante solidão. A voz deste menino me fez sentir o que não havia sentido desde que perdi meu filho. Deixe que ele ocupe, em meus braços, o lugar que o anjo da minha vida deixou vazio, e eu lhe prometo educar seus filhos e ajudá-lo para que sua carga não seja tão penosa.
          O pobre homem ficou olhando-a, murmurando tristemente:
          - Exiges muito de mim, senhora. Desfazer-se de um filho e de um filho como meu Jesus, é sacrifício superior às minhas forças; mas sou tão pobre e quero tanto bem aos meus filhos que, por seu amor, sofrerei até o martírio. Disponha, senhora, e eu a obedecerei, bendizendo sua caridade.
          Aurora não quis separar-se do menino; deixou algum dinheiro ao pai atribulado, dando-lhe várias instruções e subimos na carruagem com Jesus, que confiava que o autor dos seus dias mais tarde iria vê-lo.
          O pequenino, com o movimento da carruagem, adormeceu nos braços de Aurora.
          - Estou atordoada - dizia -, não posso descrever-te o que se passa comigo. Meu confessor assegura que estou possuída pelos maus espíritos, e esta é a causa das vozes que ouço. Sem dúvida, a essas vozes devo o bem que acabo de fazer e as doces emoções que experimentei. Enquanto abraçava este menino, pareceu-me que me davam um beijo no rosto, ouvindo estas consoladoras palavras: "Bendita sejas, minha mãe!" Se estas emoções e estes sentimentos são produzidos pelos maus espíritos, devo confessar que não os produzem tão ternos e agradáveis, os bons espíritos. Este menino, tão lindo como o meu, dever-me-á sua felicidade. Sempre olhei as riquezas com indiferença, mas, hoje, alegro-me em ser rica para cumular este menino de bens.
          - E se amanhã tiveres filho?
          - De acordo com os médicos, não voltarei a ser mãe, e este menino lucrará com isso. Diga meu confessor o que quiser, mas se desfruta muito mais fazendo o bem do que levantando templos e vestindo imagens.
          Desde aquele dia, Aurora renasceu para a felicidade. Sua casa, até então triste e solitária e cheia de Cristos, de Dolorosas e de santos, foi albergue risonho de cinco crianças, porque o pequeno Jesus havia imposto a lei do carinho e, sem seus irmãos, não queria ficar com Aurora. Seu pai foi nomeado mordomo, único meio para que, ao pequeno Jesus, nada faltasse e fosse feliz.
          Aurora não teve do que se arrepender pela sua boa obra: viveu e vive ainda amada pela família que tirou da miséria.
          Quase ao mesmo tempo que eu, conheceu e estudou o Espiritismo, vindo a saber então que devia sua salvação ao seu filho, pois era sua a voz que a separou do templo e a levou à caridade verdadeira.
          No dia em que a voz dos espíritos ressoe na Terra, compreender-se-á que não há nada melhor do que amparar os órfãos.
Autora: Amalia Domingos Soler

domingo, 15 de julho de 2012

Calma



sexta-feira, 13 de julho de 2012

Uma bela história!


ANTÔNIO!

          A generalidade dos homens fixa sua atenção nesses grandes personagens que deixam seu nome na História, pelas suas proezas nos campos de batalha, pela sua sagacidade maquiavélica no terreno político, pelo seu engenho nas belas artes, pelos estudos, descobrimentos e invenções científicas. Todavia, deixam passar desapercebidos inumeráveis seres cuja vida é um heroísmo constante, um sacrifício perpétuo, cuja abnegação irradia resplandecente. .
          Sem querermos, com nossas palavras, contrariar a opinião geral, com nossas ações, agimos, quase sempre, contrariamente à Humanidade, porque ela olha os homens que parecem grandes e nós olhamos, com inexplicável Interesse, os pequeninos da Terra, os que parecem pequeníssimos por sua posição social.
          Quando vimos desfilar as grandes tropas de exércitos vitoriosos que voltavam do campo de batalha, nossos olhos não procuraram os chefes mais renomados, mas os pobres soldados, e dissemos: quantos heróis sem glória!
          Com respeito aos grandes políticos, nos disse certa vez um conhecido homem de Estado: creia, minha amiga, que a alma dos ministérios não são os ministros, mas seus secretários particulares; que no teatro do mundo os primeiros atores, frequentemente, são os que figuram como subalternos.
          Convencidos dessa verdade, sempre procuramos nas classes humildes esses mártires do trabalho e do sofrimento, cujo nome não é consagrado pela fama e em cuja memória não se levantam monumentos de mármore ou de bronze. Mas, que importa o mundo não registrar seus feitos se tudo fica gravado na luz perene de sua eternidade?
          Quem, por exemplo, presta atenção a um desses meninos que vendem jornais pelas ruas? Quem, ao ouvi-los apregoando sua mercadoria, lembra considerar que aquela voz pode ser o eco de um coração magnânimo? Nós, antes de sabermos que o célebre Edison, o inventor do fonógrafo, da lâmpada elétrica, do microsatímetro, que dividiu em dez mil isqueiros uma só luz elétrica, esse gênio mecânico, primeiro do nosso século; antes de sabermos, repetimos, que Edison foi vendedor de jornais em uma estrada de ferro, já olhávamos com certa simpatia os pequenos veiculadores de ideias. Entre eles, encontramos um herói de trabalho, de abnegação e sacrifício.
          Quando morávamos em Madri, tínhamos o costume que têm quase todos os habitantes da Corte: comprar Correspondência da Espanha. Um garoto de 9 a 10 anos era o encarregado de nos trazer os jornais todas as noites, deixando-os em todos os quartos da casa. Sempre nos alegrávamos em ver aquele rosto risonho, adornado de grandes olhos brilhantes e expressivos.
          Certa manhã, ao entrar em uma capela evangélica, nos surpreendeu ver o pequeno distribuidor, o simpático Antônio, sentado em um banco e escutando, com atenção superior aos seus poucos anos, o discurso do pastor.
          À noite, ao vê-lo, dissemos-lhe: olha! És protestante ou apenas vendes algum jornal luterano?
          - Minha mãe pertence àquela congregação, e eu também - respondeu o pequeno com certa gravidade. Como você sabe, somos irmãos em Jesus Cristo.
          Essa identidade de ideias nos aproximou mais do pequeno Antônio, e sempre lhe fazíamos perguntas pelo prazer de ouvir suas judiciosas respostas.
          Uma noite, em que chovia torrencialmente, Antônio não nos veio trazer A Correspondêncina hora do costume. Às dez horas, fecharam a porta da casa, mas, daí a pouco, tendo ouvido chamar à porta do nosso pavimento, saímos para atender e deparamos com Antônio acompanhado do guarda noturno. Recebemos o jornal e não pudemos, pelo menos, deixar de dizer-lhe:
          - Menino, aonde vais com essa noite tão cruel? Não podias trazer o jornal pela manhã?
          Pela manhã eu tenho outras coisas a fazer.
          - Este homem tem muitas obrigações - disse o guarda a rir - já vê se terá quando me obriga a acompanhá-lo, a fim de ir abrindo as portas.
          - E tenho muitas - disse Antônio - e você sabe disso melhor que ninguém.
          - Sim, homem, sim, já o sei. Aqui neste lugar -disse-nos o guarda - encarregou-se de manter uma
criança.
          - A uma criança?
          - Sim senhora, a uma criança.
          - E como foi isso? Conte-me.
          - Muito simples. Certa noite a uns três meses, cerca de meia noite e meia, estava eu perto da casa de Antônio, quando este veio e me disse: "Olha, junto à porta do convento deixaram uma criança que chora".
          Acompanhei-o e, efetivamente, enrolada em um pano preto havia uma menina que contava uns oito dias de idade, e estava muito bem vestida. Antônio tomou-a nos braços e me disse: "Venha comigo à minha casa, pois quero ficar com esta criança". - Estás louco! - disse-lhe - para aumento de família tens tua mãe...
          - Não importa, não importa - insistiu Antônio - venha comigo e o resto corre por minha conta.
          Fomos à sua casa e a mãe de Antônio - que é ajudante de lavadeira - ao ver-nos com a enjeitada que trazíamos, tomou-a nos braços, beijou-a; Antônio se abraçou a ela e soube ajustar tão bem as coisas, que sua mãe ficou com a menina, responsabilizando-se ele pelo pagamento da ama que dela cuidaria com o que ganhava. Por isso, tem de trabalhar tanto, ainda não tem dez anos e já se converteu em pai de família.
          - Vamos, até amanhã, que tenho pressa – disse Antônio saindo com o guarda.
          Se o pequeno jornaleiro nos era simpático, desde aquela noite, sentimos por ele admiração e carinho.
          Na noite seguinte, quando chegou, perguntamos-lhe pela menina e dissemos:
          - Queremos que nos fale com vagar de tudo isso.
          - Bem, amanhã, vá cedo à capela e eu contarei.
          Não faltamos ao encontro, e Antônio já nos esperava lendo em sua Bíblia. Parecia um homenzinho. Perguntamos por sua protegida, e lhe ponderamos sobre a grande obrigação que contraiu.
          - Jeová me protege, porque lê em meu coração - replicou o menino. Parece-me que Jeová pôs Raquel naquele lugar para que eu a recolhesse, porque ao ouvi-la chorar, senti uma pena tão grande quanto quando morreu meu pai, e não fiquei tranquilo até minha mãe achar quem a criasse. Justamente uma nossa vizinha se encarregou dela e, por isso, pago-lhe dois duros todos os meses. Se você visse como está formosa! ...Eu pedi roupas à senhora do pastor e ela me deu muitas coisas; minha mãe lava-lhe os vestidos e sempre Raquel está mais branca que uma pomba. Precisas ver como a menina me conhece! Pobrezinha!  - e o olhar de Antônio irradiava felicidade.
          - Mas terás que trabalhar muito...
          - Que importa! À noite, vendo A Correspondêncie pela manhã outros periódicos; depois, vou à casa de um editor para dobrar e separar entregas. Desde que tenho Raquel em casa, tudo vai bem. Vendo o dobro de antes e, à noite, quando me retiro, e à vezes muito tarde, já não tenho medo como acontecia, parecendo-me ver sombras e fantasmas. Parece que me dizem ao ouvido: Jeová está contigo!.... e me rodeia uma luz tão linda! ... vejo meu caminho tão claro! ... Contei à minha mãe e ela ri, respondendo-me que isso é impossível, mas estou persuadido de que é verdade, porque ocorre todas as noites e sem exceção de nenhuma. Estou certo de que não me engano. .
          - Não, meu filho, não te enganas. Às almas boas como a tua, Jeová sempre acompanha. Não duvides disto: Jeová está contigo.
          - Me alegraria - ajuntou Antônio sorrindo – que minha mãe te ouvisse; veria assim que é ela quem se engana, e não eu.
          Tendo aparecido o pastor, dispôs-se a escutar, atentamente, seu discurso.
          Enquanto permanecemos em Madri, continuamos a ver Antônio, admirando cada vez mais a grandeza de sua alma.
          Quem diria - vendo aquele menino correndo pela rua, apregoando sua mercadoria - que era o amparo de um pobre ser abandonado sobre a Terra! Quem diria que aquele menino era um herói por sua abnegação e sua caridade!
          Quem diria - ao vê-lo com sua blusinha azul e seu gorro verde - que a própria irradiação do seu espírito iluminava seu caminho, e a voz do seu guia, indubitavelmente, murmurava em seus ouvidos: "Jeová está contigo"!
          Antônio! Alma boa! Tua lembrança vive em nossa memória, e sempre que vemos um pequeno jornaleiro, nos lembramos de ti e da tua amada Raquel.
          Que ação tão linda! Um filho do trabalho, um pequenino que não teve infância, converter-se em protetor de um ser abandonado no meio da rua.
          Que espírito tão evoluído! Que instintos tão generosos! Que abnegação tão pura!
          Bendito sejas Antônio! Bendito sejas!
Autora: Amália Domingos Soler

terça-feira, 10 de julho de 2012

Balanço Cristão




Que tal realizar um balanço em sua vida? Pense há quanto tempo você ouviu o chamado do Cristo, isto é, há quanto tempo você se afirma cristão. 

Depois, dê uma olhada a sua volta, em sua própria casa. O que você vê? 

As estantes estão abarrotadas de vozes caladas, livros que a traça devora. Estão ali, parados há tanto tempo que a poeira já se acumula e umas pequeninas teias de aranha aparecem entre uns e outros, só para lhe dar trabalho com a limpeza. 

Os armários estão entupidos de roupas fora da moda e que você acha que um dia voltarão a ser usadas. 

As caixas se empilham, guardando botas, sapatos, sandálias que não servem mais em seus pés. 

Em baús ou armários bem altos estão os agasalhos de inverno abandonados, entregues ao apodrecimento. 

Os móveis estão cheios de coleções de tantas coisas que você guarda, há tanto tempo que nem se recorda. 

As farmácias improvisadas estão cheias de medicamentos que aguardam as suas enfermidades, enquanto o prazo de validade expira. 

Estantes, armários, baús, caixas, pacotes cobertos de pó, mofo, bolor. Comida de traça, esconderijo para pequenos animaizinhos. 

Tanta coisa parada, sem uso. E tantos a padecer carências. 

Por isso, dê uma mexida nas estantes. Passe adiante os livros que você não vai ler. Examine o conteúdo e torne-os mensagens de vida. 

Distribua as roupas usadas, enquanto ainda estão boas, para os que se encontram desnudos, na miséria. 

Verifique se falta um botão, se há necessidade de refazer uma bainha, costurar um pequeno rasgo. Retoque e faça delas instrumentos da alegria. 

Selecione os calçados, botas e sandálias. Retifique as solas gastas, providencie uma cola aqui, uma costura ali e oferte a quem anda descalço. 

Você já aprendeu a respeito do grande número de enfermidades provocadas por pés-no-chão. 

Imagine quantas crianças terão os seus pezinhos protegidos dos cacos de vidro, das pedras pontiagudas. Quantos pés cansados, não terão mais que suportar o calor das pedras ou do frio da terra úmida. 

Desapegue-se das velhas lãs e capotes, dando-os aos sofredores. 

Propicie calor abençoado a corpos quase sem roupa. 

Conduza os remédios que estão nas prateleiras, esperando que você um dia adoeça, para postos de saúde, hospitais, clínicas comunitárias. 

Não espere a doença visitar seu corpo. Socorra as criaturas doentes nos bairros pobres, nas estradas esquecidas. 

Sacuda a poeira. Limpe o bolor. Afugente as traças. 

Conserve o que tem em movimento. Tudo o mais, distribua, demonstrando que você é senhor e não escravo de coisa alguma. 


Não espere que a dor se adorne de trapos e se apresente ao abandono, para que surja o seu momento de ajudar. 

Não espere que a miséria desnude corpos sofredores a fim de que você possa oferecer a contribuição do seu socorro. 

Não aguarde que as pessoas pereçam à falta de medicamentos. 

Vá ao encontro da dor, da necessidade e ajude com o que tiver. Distribua o que quiser. 

Atenda as ordens do seu coração de seguidor de Jesus, nosso Mestre. 

(Fonte: livro Legado Kardequiano, do Espírito Marco Prisco)

Colaboração: Sergio Giese (sergio@bsdux.com.br)

Abraços

J.L.Veiga

segunda-feira, 9 de julho de 2012

RETRATO DE MARIA



Hércio M. C. Arantes 

Algum tempo após tomarmos conhecimento de um novo quadro de Maria, a Mãe de Jesus, divulgado num programa da TV Record, de São Paulo, com a presença de Francisco Cândido Xavier, procuramos esse médium amigo para colher dele maiores esclarecimentos sobre a origem do mesmo.
Contou-nos, então, Chico Xavier, no final da reunião pública do Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, na noite de 1º de dezembro de 1984, que, com vistas às homenagens do Dia das Mães de 1984, o Espírito de Emmanuel ditou, por ele, um retrato falado de Maria de Nazaré ao fotógrafo Vicente Avela, de São Paulo. Esse trabalho artístico foi sendo realizado aos poucos, desde meados de 1983, com retoques sucessivos realizados pela grande habilidade de Vicente, em mais de vinte contatos com o médium mineiro, na Capital paulista.
Em nossa rápida entrevista, Chico frisou que a fisionomia de Maria, assim retratada, revela tal qual Ela é conhecida quando de Suas visitas às esferas espirituais mais próximas e perturbadas da crosta terrestre; como, por exemplo, disse-nos ele, na Legião dos Servos de Maria, grande instituição de amparo aos suicidas descrita detalhadamente no livro Memórias de um Suicida, recebido mediunicamente por Yvonne A. Pereira.
E, ao final do diálogo fraterno, atendendo nosso pedido, Chico forneceu-nos o endereço do fotógrafo-artista, para que pudéssemos entrevistá-lo oportunamente, podendo assim registrar mais algum detalhe do belo trabalho realizado.

De fato, meses após essa entrevista, tivemos o prazer de conhecer o sr. Vicente Avela, em seu próprio ateliê, há 30 anos localizado na Rua Conselheiro Crispiniano, 343, 2º andar, na Capital paulista, onde nos recebeu atenciosamente.
Confirmando as informações do médium de Uberaba ele apenas destacou que, de fato, não houve pintura e sim um trabalho basicamente fotográfico, fruto de retoques sucessivos num retrato falado inicial, tudo sob a orientação mediúnica de Chico Xavier.
Quando o sr. Vicente concluiu a tarefa, com a arte final em pequena foto branco-e-preto, ele a amplicou bastante e coloriu-a com tinha a óleo  (trabalho em que é perito, com experiência adquirida na época em que não havia filmes coloridos e as fotos em preto-e-branco eram coloridas a mão), dando origem à tela que foi divulgada.
Nesse encontro fraterno, também conhecemos o lindo quadro original à vista em parede de seu escritório, e ao despedirmo-nos, reconhecidos pela atenção, o parabenizamos por esse árduo e excelente trabalho, representando mais uma notícia da vida espiritual de Maria de Nazaré, que continua amparando com imenso amor maternal a Humanidade inteira.
Fonte Anuário Espírita 1986


Fonte: http://www.universoespirita.org.br/servicos/foto_maria_DESCRICAO.htm

MOZART VIVE!



Em 27 de janeiro de 1756 nascia na Áustria o compositor  Wolfgang Amadeus Mozart. Como Espírito, deu uma das mais belas comunicações espíritas de que se tem notícia. Foi evocado por Allan Kardec na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas e ditou um fragmento de sonata ao médium Bryon Dorgeval. O Codificador do Espiritismo publicou as evocações particulares e a da Sociedade Parisiense. Leia aqui o que disse Mozart. 
Conversas familiares de além-túmulo - Mozart
Revista Espírita, maio de 1858
Um dos nossos assinantes nos comunica as duas conversas seguintes que ocorreram com o Espírito de Mozart. Não sabemos nem onde e nem quando essas conversas tiveram lugar; não conhecemos nem os interrogadores, nem o médium; nelas somos, pois, completamente estranhos. Apesar disso, notar-se-á a concordância perfeita que existe entre as respostas obtidas e as que foram dadas por outros Espíritos, sobre diversos pontos capitais da Doutrina, em circunstâncias diferentes, seja a nós, seja a outras pessoas, e que narramos em nossos fascículos precedentes, e em O Livro dos Espíritos. Chamamos, sobre essa semelhança, toda a atenção dos nossos leitores, que dela tirarão a conclusão que julgarem a propósito. Aqueles, pois, que poderiam ainda pensar que as respostas às nossas perguntas podem ter o reflexo de nossa opinião pessoal, verão por aí se, nessa ocasião, pudemos exercer uma influência qualquer. Felicitamos as pessoas que fizeram essas entrevistas pela maneira com que as perguntas estão postas. Apesar de certas faltas que decorrem da inexperiência dos interlocutores, em geral, estão formuladas com ordem, clareza e precisão, e não se afastam da linha séria: é uma condição essencial para se obter boas comunicações. Os Espíritos elevados vão às pessoas sérias que querem se esclarecer de boa-fé; os Espíritos levianos se divertem com as pessoas frívolas.

PRIMEIRA CONVERSA

1. Em nome de Deus, Espírito de Mozart, estás aqui? - R. Sim.
2. Por que antes Mozart do que um outro Espírito? - R. Foi a mim que haveis evocado: eu vim.
3. O que é um médium? - R. O agente que une o meu Espírito ao teu.
4. Quais são as modificações, tanto fisiológicas quanto anímicas, que, sem o saber, o médium sofre quando entra em ação intermediária? - R. Seu corpo não sente nada, mas seu Espírito, em parte desligado da matéria, está em comunicação com o meu e me une a vós.
5. O que se passa nele, nesse momento? - R. Nada para o corpo; mas uma parte do seu Espírito é atraída para mim; faço sua mão agir pelo poder que meu Espírito exerce sobre ele.
6. Assim, o indivíduo médium entra, então, em comunicação com uma individualidade espiritual outra que a sua? - R. Certamente; também tu, sem seres médium, estás em relação comigo.
7. Quais são os elementos que concorrem para a produção desse fenômeno? - R. Atração dos Espíritos para instruírem os homens; leis de eletricidade física.
8. Quais são as condições indispensáveis? - R. É uma faculdade concedida por Deus.
9. Qual é o princípio determinante? - R. Não posso dize-lo.
10. Poderias dele nos revelar as leis? - R. Não, não, não no presente; mais tarde sabereis tudo.
11. Em quais termos positivos poder-se-ia enunciar a fórmula sintética desse maravilhoso fenômeno? - R. Leis desconhecidas, que não poderiam ser compreendidas por vós.
12. O médium poderia se pôr em relação com a alma de um vivo, e em que condições? - R. Facilmente, se o vivente dorme (1- (1) Se uma pessoa viva for evocada no estado de vigília, pode adormecer no momento da evocação, ou pelo menos experimentar um entorpecimento e uma suspensão das faculdades sensitivas; mas, muito freqüentemente, a evocação não dá resultado, sobretudo se não for feita com uma intenção séria e benevolente.).
13. Que entendes pela palavra alma? - R. A centelha divina.
14. E por Espírito? - R. O Espírito e a alma são uma mesma coisa.
15. A alma, enquanto Espírito imortal, tem consciência do ato da morte, e consciência dela mesma, ou do eu, imediatamente depois da morte? - R. A alma nada sabe do passado e não conhece o futuro senão depois da morte do corpo; então vê sua vida passada e suas últimas provas; escolhe a sua nova expiação, por uma vida nova, e a prova que vai suportar; também não deve se lamentar do que se sofre na Terra, e deve suportá-la com coragem.
16. A alma se encontra, depois da morte, desligada de todo elemento, de todo laço terrestre? - R. De todo elemento, não; ela tem ainda um fluido que lhe é próprio, que haure na atmosfera do seu planeta, e que representa a aparência da sua última encarnação; os laços terrestres não lhe são mais nada.
17. Ela sabe de onde vem e para onde vai? - R. A questão décima-quinta responde a isso.
18. Não leva nada com ela deste mundo? - R. Nada senão a lembrança de suas boas ações, o arrependimento de suas faltas, e o desejo de ir para um mundo melhor.
19. Ela abarca, de um golpe de vista retrospectivo, o conjunto da sua vida passada? - R. Sim, para servir à sua vida futura.
20. Ela entrevê o objetivo da vida terrestre e a significação, o sentido dessa vida, assim como o curso que lhe fornecemos com respeito à vida futura? - R. Sim; ela compreende a necessidade de depuração para chegar ao infinito; quer se purificar para alcançar mundos bem-aventurados. Sou feliz; mas não estou eu já nos mundos onde se goza da visão de Deus!
21. Existe na vida futura uma hierarquia de Espíritos, e qual é sua lei? - R. Sim: é o grau de depuração que a define; a bondade, as virtudes são os títulos de glória.
22. É a inteligência, enquanto força progressiva, que lhe determina a marcha ascendente? - R. Sobretudo as virtudes: o amor ao próximo acima de tudo.
23. Uma hierarquia de Espíritos fará supor uma outra de residência; esta última existe e de que forma? - R. A inteligência, dom de Deus, é sempre a recompensa das virtudes: caridade, amor ao próximo. Os Espíritos habitam diferentes planetas, segundo o seu grau de perfeição: neles gozam de mais ou menos felicidade.
24. O que é preciso entender por Espíritos superiores? - R. Os Espíritos purificados.
25. Nosso globo terrestre é o primeiro de seus degraus, o ponto de partida, ou viemos de mais baixo? - R. Há dois globos antes do vosso, que é um dos menos perfeitos.
26. Qual é o mundo que habitas? És feliz? - R. Júpiter. Nele gozo de uma grande calma; amo todos aqueles que me cercam; não temos mais ódio.
27. Se tens lembrança da vida terrestre, deves lembrar dos esposos A..., de Viena; haveis revisto todos os dois depois da morte, em qual mundo e em quais condições? - R. Não sei onde estão; não posso dizer-te. Um é mais feliz do que o outro. Por que me falas deles?
28. Podes, por uma única palavra indicativa de um fato capital da vida, que não podes haver esquecido, fornecer-me uma prova certa dessa lembrança. Eu te suplico dizer essa palavra - R. Amor; reconhecimento.

SEGUNDA CONVERSA

O interlocutor não é o mesmo. Julga-se, pela natureza da conversação, tratar-se de um artista músico, feliz por conversar com um mestre. Após diversas questões que cremos inútil relatar, Mozart diz:
1. Acabemos com as perguntas de G...: falarei contigo; dir-te-ei o que entendemos por melodia em nosso mundo. Por que não me evocaste mais cedo? Eu teria respondido.
2. O que é a melodia? - R. Freqüentemente, é para ti uma lembrança da vida passada; teu Espírito se lembra do que entreviu num mundo melhor. No planeta onde estou, Júpiter, a melodia está por toda parte, no murmúrio da água, o ruído das folhas, o canto do vento; as flores murmuram e cantam; tudo emite sons melodiosos. Sé bom; ganha esse planeta pelas tuas virtudes; escolheste bem cantando Deus: a música religiosa ajuda a elevação da alma. Quanto gostaria poder vos inspirar o desejo de ver esse mundo onde se é tão feliz! está pleno de caridade; tudo ali é belo! A Natureza tão admirável! Tudo vos inspira o desejo de estar com Deus. Coragem! Coragem! Crede bem em minha comunicação espírita: sou bem eu que lá estou; alegro-me em poder dizer-vos o que experimentamos; que eu possa vos inspirar bastante o amor ao bem para vos tornar dignos dessa recompensa, que nada são perto das outras às quais aspiro!
3. Nossa música é a mesma nos outros planetas? - R. Não; nenhuma música pode vos dar a idéia da música que temos ali; é divina! Ó felicidade! merece gozar de semelhantes harmonias: luta; coragem! Não temos instrumentos; são as plantas, os pássaros que são os coristas; o pensamento compõe e os ouvintes desfrutam sem audição material, sem o recurso da palavra, e isso a uma distância incomensurável. Nos mundos superiores isso é ainda mais sublime.
4. Qual é a duração da vida de um Espírito encarnado em outro planeta, que não seja o nosso? - R. Curta nos planetas inferiores; mais longa nos mundos como aquele onde tenho a felicidade de estar; em média, em Júpiter, ela é de trezentos a quinhentos anos.
5. Há uma grande vantagem em voltar a habitar na Terra? - R. Não, a menos que seja em missão; então, se avança.
6. Não se seria mais feliz permanecendo Espírito? - R. Não, não! estacionar-se-ia; pede-se ao ser reencarnado para avançar para Deus.
7. É a primeira vez que estou na Terra? - R. Não; mas não posso falar-te do passado de teu Espírito.
8. Poderia ver-te em sonho? - R. Se Deus o permitir, far-te-ei ver minha casa em sonho, e dela te recordarás. (ver abaixo)
9. Onde estás aqui? - R. Entre ti e tua filha, eu vos vejo; estou sob a forma que tinha quando vivo.
10. Eu poderia ver-te? - R. Sim; crê e verás. Se tivesses maior fé, ser-nos-ia permitido dizer o porquê; tua própria profissão é um laço entre nós.
11. Como entraste aqui? - R. O Espírito atravessa tudo.
12. Estás ainda bem longe de Deus? - R. Ó! sim!
13. Compreendes melhor do que nós o que é a eternidade? -R. Sim, sim, não podeis compreendê-la tendo um corpo.
14. Que entendes pelo Universo? Teve começo e terá um fim? - R. O Universo, segundo vós, é vossa Terra! Insensatos! O Universo não teve começo e não terá fim; pensai que é a obra inteira de Deus; o Universo é o Infinito.
15. O que se deve fazer para ficar calmo? - R. Não te inquietes tanto pelo teu corpo; terás o Espírito perturbado; resiste a essa tendência
16. O que é essa perturbação? - R. Temes a morte.
17. Que fazer para não temê-la? - R. Crê em Deus; crê sobretudo, que Deus não arrebata sempre um pai útil à sua família.
18. Como chegar a essa calma? - R. O querer.
19. Onde haurir essa vontade? - R. Distrai teu pensamento disso pelo trabalho.
20. Que devo fazer para aperfeiçoar meu talento? - R. Podes me evocar; obtive a permissão de te inspirar.
21. Isso quando trabalhar? - R. Certamente! Quando quiseres trabalhar, algumas vezes estarei perto de ti.
22. Ouvirás minha obra? (uma obra musical do interrogador) -R. És o primeiro músico que me evoca; venho a ti com prazer e escuto as tuas obras.
23. Como ocorre que nunca foste evocado? - R. Fui evocado, mas não por músicos.
24. Por quem? - R. Por várias damas e amadores, em Marseille.
25. Por que a Ave...me toca até às lágrimas? - R. Teu Espírito se desliga e se junta ao meu e ao de Per-golèse, que me inspirou essa obra, mas esqueci esse pedaço.
26. Como podes esquecer a música composta por ti? - R. A que existe aqui é tão bela! Como lembrar-se daquilo que era todo matéria?
27. Vês minha mãe? - R. Ela está encarnada na Terra.
28. Em que corpo? - R. Disso nada posso dizer.
29. E meu pai? - R. Está errante para ajudar ao bem; fará tua mãe progredir; estarão reencarnados juntos, e serão felizes.
30. Vem me ver? - R. Freqüentemente; tu lhe deves os movimentos caridosos.
31. Foi minha mãe quem pediu para estar reencarnada? - R. Sim; disso tinha um grande desejo, para subir por uma nova prova e entrar num mundo superior à Terra; ela já deu um passo imenso.
32. Que queres dizer com isso? - R. Ela resistiu a todas as tentações; sua vida na Terra foi sublime em comparação com o seu passado, que era o de um Espírito inferior; também subiu vários degraus.
33. Tinha, pois, escolhido uma prova acima das suas forças? -R. Sim, é isso.
34. Quando sonho que a vejo, é ela mesma que vejo? - R. Sim, sim.
35. Se tivesse evocado Bichat no dia da ereção de sua estátua, teria respondido? Estava lá? - R. Estava, e eu também.
36. Porque ali estavas? - R. Com vários outros Espíritos que se alegram com o bem, e que ficam felizes em ver que glorificais aqueles que se ocupam com a Humanidade sofredora.
37. Obrigado, Mozart; adeus. - R. Crede, crede que ali estou... Sou feliz... Crede que há mundos acima do vosso... Crede em Deus... Evocai-me mais freqüentemente, e em companhia de músicos; estarei feliz por vos instruir e contribuir para o vosso adiantamento, e de vos ajudar a subir até Deus. Evocai-me; adeus.

MÚSICA DE ALÉM-TÚMULO
Revista Espírita de Maio, 1859

   O Espírito de Mozart acaba de ditar ao nosso excelente médium, sr. Bryon Dorgeval, um fragmento de sonata. Como método de controle, o médium o fez ouvir por diversos especialistas, sem lhes indicar a origem, mas lhes perguntando apenas o que achavam no trecho. Cada um nele reconheceu, sem hesitação, o cunho de Mozart. O trecho foi executado na sessão da Sociedade de 8 de abril último, em presença de numerosos conhecedores, pela senhorita de Davans, aluna de Chopin e distinta pianista, que teve a gentileza de nos emprestar o seu concurso. Como elemento de comparação, a senhorita de Davans executou antes uma sonata de Mozart, composta quando vivo. Todos foram unânimes em reconhecer não só a perfeita identidade do gênero, mas a superioridade da composição espírita. A seguir, pela mesma pianista, foi executado um trecho de Chopin, com o seu talento habitual.
Não poderíamos perder esta ocasião para evocar os dois compositores, com os quais tivemos a seguinte palestra.
MOZART
1. - Sem dúvida conheceis o motivo por que vos chamamos.
- Vosso apelo é-me agradável.
2. - Reconheceis como tendo sido ditado por vós o trecho que acabamos de ouvir?
- Sim. Eu o reconheço perfeitamente. O médium que me serviu de intérprete é um amigo que me não traiu.
3. - Qual dos dois trechos preferis?
- Sem comparação, o segundo.
4. - Porque?
- A doçura e o encanto nele são mais vivos e, ao mesmo tempo, mais delicados.
NOTA:   São, realmente, estas as qualidades reconhecidas no trecho.
5. - A música do mundo que habitais pode comparar-se à nossa?
- Teríeis dificuldades de compreender. Temos sentidos que ainda não possuís.
6. - Disseram-nos que no vosso mundo há uma harmonia natural, universal, que aqui não conhecemos.
- É verdade. Em vossa Terra fazeis a música; aqui toda a natureza faz ouvir sons melodiosos.
7. - Poderíeis vós mesmo tocar piano?
- Sem dúvida que sim. Mas não o quero: seria inútil.
8. - Seria, entretanto, poderoso motivo de convicção.
- Não estais convencidos?
NOTA:   Sabe-se que os Espíritos jamais se submetem a provas. Muitas vezes fazem espontaneamente aquilo que lhes não pedimos. Esta, aliás, entra na categoria das manifestações físicas, com o que se não ocupam os Espíritos elevados.
9. - Que pensais da recente publicação de vossas cartas?
- Avivaram muito as minhas lembranças.
10. - Vossa lembrança está na memória de todos. Poderíeis precisar o efeito que essas cartas produziram?
- Sim. Apegaram-se muito mais a mim como homem do que antes.
NOTA:  A pessoa, aliás estranha à Sociedade, que fez estas últimas perguntas, confirma que essa foi, realmente, a impressão produzida por aquela publicação.
11. - Desejamos interrogar Chopin. É possível?
- Sim. Ele é mais triste e mais sombrio que eu.
CHOPIN

12. - Poderíeis dizer-nos em que situação vos achais como Espírito?
- Sim: ainda errante.
13. - Lamentais a vida terrena?
- Eu não sou infeliz.
14. - Sois mais feliz do que antes?
- Sim, um pouco.
15. - Dizeis um pouco, o que quer dizer que não há grande diferença. Que é o que vos falta para o serdes mais?
- Eu digo um pouco em relação àquilo que eu poderia ter sido; porque com a minha inteligência eu poderia ter avançado mais do que avancei.
16. - Esperais alcançar um dia a felicidade que vos falta atualmente?
- Certamente que ela virá. Não serão necessárias novas provas.
17. - Mozart disse que sois sombrio e triste. Por que isto?
- Mozart tem razão. Entristeço-me porque tinha empreendido uma prova que não realizei bem e não tenho coragem de recomeçá-la.
18. - Como considerais as obras musicais?
- Eu as prezo muito. Mas entre nós fazemo-las melhores; sobretudo as executamos melhor. Dispomos de mais recursos.
19. - Quem são, pois, os vossos executantes?
- Temos às nossas ordens legiões de executantes, que tocam as nossas composições com mil vezes mais arte do que qualquer de vós. São músicos completos. O instrumento de que se servem é a própria garganta, por assim dizer, e são auxiliados por uns instrumentos, espécies de órgãos, de uma precisão e de uma melodia que, parece, não podeis compreender.
20. - Sois muito errante?
- Sim. Isto é, não pertenço a nenhum planeta exclusivamente.
21. - E os vossos executantes? São, também, errantes?
- Errantes como eu.
22. - (A Mozart). Teríeis a bondade de explicar o que acaba de dizer Chopin? Não compreendemos essa execução por Espírito errantes.
- Compreendo o vosso espanto. Entretanto já vos dissemos que há mundos particularmente afetos aos seres errantes, mundos nos quais podem habitar temporariamente, espécies de bivaques, de campos de repouso para seus Espíritos, fatigados por uma longa erraticidade, estado sempre um pouco penoso.
23. - (A Chopin). Reconheceis aqui um de vossos alunos?
- Sim. Parece.
24. - Teríeis a bondade de assistir à execução de um trecho de vossa composição?
- Isto me daria muito prazer, sobretudo quando executado por uma pessoa que guardou de mim uma grata recordação. Que ela receba os meus agradecimentos.
25. - Quereis dar a vossa opinião sobre a música de Mozart?
- Gosto muito. Considero Mozart como meu mestre.
26. - Partilhais de sua opinião sobre o música de hoje?
- Mozart disse que a música era melhor compreendida em seu tempo do que hoje. Isto é verdade. Objetarei, entretanto, que ainda existem verdadeiros artistas.

OBSERVAÇÃO: O fragmento da sonata ditada pelo Espírito de Mozart acaba de ser publicado. Pede ser adquirido no Escritório da Revue Spirite, na livraria espírita do sr. Ledoyen, Palais Royal, Galerie d'Orléans, 31. Preço: 2 francos. - Será remetida franqueada contra vale postal daquela importância.

Allan Kardec