segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

O Futuro

Não tem um filme que eu assista que não apresente um futuro catastrófico para o planeta Terra, pintado em um mundo cinza, destruído por guerras nucleares, poluição e um sem número de consequências dos desmandos da raça humana, em sua ganância insaciável.

Parece-me que a Guerra Fria, onde nos vimos a beira de um holocausto nuclear, nos impregnou de uma consciência pesada coletiva, uma decepção generalizada com a raça humana, onde nos vemos destruindo o planeta. Uma visão pessimista do espírito imortal, onde tombaríamos derrotados pelo nosso orgulho e egoísmo, nos destruindo em uma hecatombe sem precedentes.

É preciso acreditar nas potencialidades do homem, espírito encarnado, como herdeiro de Deus capaz de se melhorar e de superar as suas mazelas morais. Nesse sentido, vejamos o que nos diz a Doutrina espírita, com seu marcante caráter libertador de consciências, sobre a natureza do espírito e do seu porvir?

A gênese assevera, no seu Cap. XVII, que: “64. – A doutrina de um juízo final, único e universal, pondo fim para sempre à Humanidade, repugna à razão, por implicar a inatividade de Deus, durante a eternidade que precedeu à criação da Terra e durante a eternidade que se seguirá à sua destruição.” Apresenta o trecho a inviabilidade de um desejo divino oculto e sádico de destruir a sua própria criação.

Da mesma forma, o Cap. XV do Evangelho indica: “No quadro que traçou do juízo final, deve-se, como em muitas outras coisas, separar o que é apenas figura, alegoria”, apresentando a necessidade de se olhar esse arquétipo do fim dos tempos, ainda tão em voga, com os olhos de ver e os ouvidos de ouvir.

Por fim, temos a pergunta n° 1019, do LE, que nos diz: “Por meio do progresso moral e praticando as leis de Deus é que o homem atrairá para a Terra os bons Espíritos e dela afastará os maus. Estes, porém, não a deixarão, senão quando daí estejam banidos o orgulho e o egoísmo. “Predita foi a transformação da Humanidade e vos avizinhais do momento em que se dará, momento cuja chegada apressam todos os homens que auxiliam o progresso. Essa transformação se verificará por meio da encarnação de Espíritos melhores, que constituirão na Terra uma geração nova.”

Esses breves excertos de nossas obras básicas não deixam dúvidas de que essa idéia de futuro catastrófico, ancorada na visão de um Deus passional e vingativo, não tem eco nas límpidas elucidações da doutrina espírita, que apresenta a idéia da evolução, onde todos como filhos do Pai, tem a chance de evoluir, pelas bênçãos da reencarnação, em um conceito de Deus infinitamente justo e bom, que ama a todos.

Desde a passagem do último milênio, as produções culturais nos brindam com essas visões destrutivas do futuro, e diversas religiões asseveram o fim, perplexas com as mudanças ciclópicas que chegam aos costumes, pela tecnologia e pela globalização.

De nós, espíritas, espera-se uma visão mais ampla dessa questão, entendendo que a chegada da geração nova será marcada por avanços espirituais e que Deus continua sendo o mesmo pai amantíssimo que nos ensinou Jesus, passados dois mil anos. Um Pai que aposta em nós a cada vez que nos oferta a bendita oportunidade da reencarnação.

Por fim, citando o Poeta Vinicius de Moraes na canção “Cotidiano n° 2”: “Aí pergunto a Deus: escute, amigo, se foi pra desfazer, por que é que fez?”, percebemos na simplicidade do pensamento, a obviedade da realidade.


Marcus Braga


fonte: http://www.espiritbook.com.br/m/blogpost?id=6387740%3ABlogPost%3A2398294

domingo, 8 de janeiro de 2017

Marcus Vinicius de Azevedo Braga: "A Carne"

Enquanto dirigia no centro do Rio de Janeiro, retornando do trabalho, vi em um muro a seguinte inscrição: “Se a carne é fraca, por que perdemos sempre para ela?”. A reflexão sobre essa pérola estampada na paisagem urbana me fez recordar, divagando na direção, de como essa expressão, “a carne é fraca”, serve para nos justificarmos, perante nós e perante os outros, por deslizes, erros e vacilos. Uma muleta diante do arrependimento e da derrota.

Invocamos a carne é fraca como indicação de que a intenção de acertar é boa, mas as forças atávicas, a animalidade oriunda da carne nos suplanta, nos conduzindo à conduta reprovável, de forma irresistível. Uma visão de culpabilidade, de castigo, justificativas e até de um certo puritanismo, que ignora a nossa condição humana, frente aos desafios e que as lutas são diárias, para todos. Errar e cair faz parte do nosso processo de evolução. 

Kardec não desconsiderou essa discussão. Pelo contrário, trata dela de forma bem interessante no livro “O céu e o inferno”, e, nesse sentido, destaco o seguinte trecho: “Pode-se, portanto, admitir que o temperamento é, pelo menos em parte, determinado pela natureza do espírito, que é causa e não efeito. (...) Justificar seus erros pela fraqueza da carne é apenas um subterfúgio para escapar à responsabilidade. A carne só é fraca porque o espírito é fraco, o que reverte a questão, e deixa ao espírito a responsabilidade de todos os seus atos”.

Colocando assim a gênese das questões no espírito, que em última instância somos nós, na estrada da eternidade. Mas, voltemos ao muro... Se tudo está no espírito, como responsável, por que perdemos para as tentações chamadas da carne, fraca por ser sem relevância? A carne aqui representa a inserção no mundo material, suas influências, rompendo essa dicotomia corpo-espírito, mostrando de que forma a realidade concreta nos molda e por nós é moldada.

Perdemos pois desconsideramos a carne, tentando separá-la da matéria como caixas herméticas. Na senda evolutiva nesse mundo, na carne, interagimos com a realidade que se apresenta, crescendo com ela. A cada encarnação apresenta-se um novo cenário, que nos exige mudanças interiores e exteriores, construindo assim o espírito que necessitamos. Inseparável, a relação espírito-matéria é a fonte do crescimento espiritual, não cabendo o desprezo pela vida material, nem o apego excessivo a esta.

A carne não é fraca. Ela é forte como instrumento que testa as nossas fraquezas, que nos serve de desafio para aferir nosso crescimento, como prova de superação, e não devemos subestimá-la. Pelo contrário, perdemos para ela pela nossa fraqueza, como ressalta Kardec, em colocar no espírito a causa, responsável pelos seus atos, mas não devemos desconsiderar a máxima da proporcionalidade do fardo que recebemos com as nossas capacidades.

Eis a questão. Não devemos subestimar os fardos, o ambiente e a sua influência. A nossa vontade, quando submetida à prova, pode capitular, e devemos atentar para as provas a que nos habilitamos, sabendo se poderemos encarar a derrota, levantar e dar a volta por cima, sem colocar na fraqueza da carne a culpa por tudo. Por vezes abraçamos fardos múltiplos e simultâneos e caímos, justificando com a desculpa da carne fraca. Os depoimentos de Espíritos, após a desencarnação, são cheios dessas falas.

Só dizer que tudo é culpa do espírito pode ser um discurso também muito cruel com aquele que cai. Quem está na prova, correndo à frente do “Rolo compressor” das dificuldades, sabe que não é fácil e por isso encarnamos, quantas vezes forem necessárias, na busca do aperfeiçoamento. Não cabe “a carne é fraca” para quem se justifica, mas também para quem acusa.

Desse modo, fugindo de uma visão mais pecaminosa, temos o espírito presidindo os processos e lutas, na jornada terrestre na carne, que nos serve de instrumento para os desafios da evolução. Ambos são fortes! O espírito que se supera e surpreende, a cada dia, e a carne, que por vezes nos derruba para levantar de novo. É um processo de crescimento e de autoconhecimento, que nos leva a pensar na magnitude dos desafios, e, se às vezes, por eles serem fortes, dentro de nosso fraco espírito, se vale a pena encarar alguns deles em determinados momentos, ou administrar as questões em recuos estratégicos.

http://www.oconsolador.com.br/ano10/498/ca5.html