segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Separação entre Conjugues Espiritas

Ocorre separação entre cônjuges espirituais?

Pode acontecer, por exemplo, que as autoridades superiores escolham um dos cônjuges para serviço particular entre os homens, atendendo a qualidades especiais que possua e com que deva satisfazer a questões e eventualidades terrestres.
Além disso, esse ou aquele cônjuge, após venturoso estágio na esfera superior, necessita regressar aos círculos carnais para experiências difíceis no resgate de compromissos determinados.
Em ambas as modalidades de separação compreensível e justa, o companheiro ou a companheira em condição de superioridade, pelo menos circunstancialmente, roga, com êxito, a possibilidade de custodiar o objeto de sua veneração e de seu carinho, quase sempre na posição de reencarnados, em regime de completa renúncia.

(Evolução em Dois Mundos, Parte II, IX, André Luiz/Chico Xavier/Waldo Vieira, FEB)

O CASO TOBIAS - No terceiro dia de trabalho, alegrou-me Tobias com agradável surpresa. Findo o serviço, ao entardecer, de vez que outros se incumbiram da assistência noturna, fui fraternalmente levado à residência dele, onde me aguardavam belos momentos de alegria e aprendizado.


Logo de entrada, apresentou-me duas senhoras, uma já idosa e outra bordejando a madureza. Esclareceu que esta era sua esposa e aquela, irmã. Luciana e Hilda, afáveis e delicadas, primaram em gentilezas.


Reunidos na formosa biblioteca de Tobias, examinamos volumes maravilhosos na encadernação e no conteúdo espiritual.


A senhora Hilda convidou-me a visitar o jardim, para que pudesse observar, de perto, alguns caramanchões de caprichosos formatos. Cada casa, em "Nosso Lar", parecia especializar-se na cultura de determinadas flores. Em casa de Lísias, as glicínias e os lírios contavam-se por centenas; na residência de Tobias, as hortênsias inumeráveis desabrochavam nos verdes lençóis de violetas. Belos caramanchões de árvores delicadas,


recordando o bambu ainda novo, apresentavam no alto uma trepadeira interessante, cuja especialidade é unir frondes diversas, à guisa de enormes laços floridos, na verde cabeleira das árvores, formando gracioso teto.


Não sabia traduzir minha admiração. Embalsamava-se a atmosfera de inebriante perfume. Comentávamos a beleza da paisagem geral, vista daquele ângulo do Ministério da Regeneração, quando Luciana nos chamou ao interior, para leve refeição.


Encantado com o ambiente simples, cheio de notas de fraternidade sincera, não sabia como agradecer ao generoso anfitrião.


A certa altura da palestra amável, Tobias acrescentou, sorridente:


- O meu amigo, a bem dizer, é ainda novato em nosso Ministério e talvez desconheça o meu caso familiar.


Sorriam ao mesmo tempo as duas senhoras; e, observando-me a silenciosa interpelação, o dono da casa continuou:


- Aliás, temos numerosos núcleos nas mesmas condições. Imagine que fui casado duas vezes...


E, indicando as companheiras de sala, prosseguiu num gesto de bom


humor:


- Creio nada precisar esclarecer quanto às esposas.


- Ah! sim - murmurei extremamente confundido -, quer dizer que as senhoras Hilda e Luciana compartilharam das suas experiências na Terra...


- Isso mesmo - respondeu tranqüilo.


Nesse ínterim, a senhora Hilda tomou a palavra, dirigindo-se a mim:


- Desculpe o nosso Tobias, irmão André. Ele está sempre disposto a falar do passado, quando nos encontramos com alguma visita de recém-chegados


da Terra.


- Pois não será motivo de júbilo - aduziu Tobias bem-humorado -, vencer o monstro do ciúme inferior, conquistando, pelo menos, alguma expressão de fraternidade real?


- De fato - objetei -, o problema interessa profundamente a todos nós. Há milhões de pessoas, nos círculos do planeta, em estado de segundas núpcias. Como resolver tão alta questão afetiva, considerando a espiritualidade eterna? Sabemos que a morte do corpo apenas transforma sem destruir. Os laços da alma prosseguem, através do Infinito. Como


proceder? Condenar o homem ou a mulher que se casaram mais de uma vez? Encontraríamos, porém, milhões de criaturas nessas condições. Muitas vezes já lembrei, com interesse, a passagem evangélica em que o Mestre nos promete a vida dos anjos, quando se referiu ao casamento na Eternidade.


- Forçoso é reconhecer, todavia, com toda a nossa veneração ao Senhor - atalhou o anfitrião, bondoso -, que ainda não nos achamos na esfera dos anjos e, sim, dos homens desencarnados.


- Mas, como solucionar aqui semelhante situação? - perguntei.


Tobias sorriu e considerou:


- Muito simplesmente; reconhecemos que entre o irracional e o homem há enorme série gradativa de posições. Assim, também, entre nós outros, o caminho até o anjo representa imensa distância a percorrer. Ora, como podemos aspirar à companhia de seres angélicos, se ainda não somos nem mesmo fraternos uns com os outros? Claro que existem caminheiros de ânimo forte, que se revelam superiores a todos os obstáculos da senda, por supremo esforço da vontade; mas a maioria não prescinde de pontes ou do socorro de guardiães caridosos. Em vista dessa verdade, os casos dessa natureza são resolvidos nos alicerces da fraternidade legítima, reconhecendo-se que o verdadeiro casamento é de


almas e essa união ninguém poderá quebrantar.


Nesse instante, Luciana, que se mantinha silenciosa, interveio, acrescentando:


- Convém explicar, todavia, que tudo isso, felicidade e compreensão, devemos ao espírito de amor e renúncia de nossa Hilda.


A senhora Tobias, no entanto, demonstrando humildade digna, acentuou:


- Calem-se. Nada de qualidades que não possuo. Buscarei sumariar nossa história, a fim de que nosso hóspede conheça meu doloroso aprendizado.


E continuou, depois de fixar um gesto de narradora amável:


- Tobias e eu nos casamos na Terra, quando ainda muito jovens, em obediência a sagradas afinidades espirituais. Creio desnecessário descrever a felicidade de duas almas que se unem e se amam verdadeiramente no matrimônio. A morte, porém, que parecia enciumada de nossa ventura, subtraiu-me do mundo, por ocasião do nascimento do segundo filhinho.


Nosso tormento foi, então, indescritível. Tobias chorava sem remédio, ao passo que eu me via sem forças para sufocar a própria angústia. Pesados dias de Umbral abateram-se sobre mim. Não tive remédio senão continuar agarrada ao marido e ao casal de filhinhos, surda a todo esclarecimento que os amigos espirituais me enviavam, por intuição.


Queria lutar, como a galinha ao lado dos pintainhos. Reconhecia que o esposo necessitava reorganizar o ambiente doméstico, que os pequeninos reclamavam assistência maternal. Tornava-se a situação francamente insuportável. Minha cunhada solteira não tolerava as crianças e a cozinheira apenas fingia dedicação. Duas amas jovens pautavam toda a conduta pessoal pela insensatez. Não pôde Tobias adiar a solução justa e, decorrido um ano da nova situação, desposou Luciana, contrariando meus caprichos. Ah! se soubesse como me revoltei! Semelhava-me a uma loba ferida. Minha ignorância deu até para lutar com a


pobrezinha, tentando aniquilá-la. Foi aí que Jesus me concedeu a visita providencial de minha avó materna, desencarnada havia muitos anos. Chegou ela como quem nada desejava, enchendo-me de surpresa, sentou-se a meu lado, pôs-me em seguida ao colo, como noutro tempo, e perguntou-me lacrimosa: - "Que é isso, minha neta? Que papel é o seu na vida? Você é leoa ou alma consciente de Deus? Pois nossa irmã Luciana serve de mãe a seus filhos, funciona como criada de sua casa, é jardineira do seu jardim, suporta a bílis do seu marido e não pode assumir o lugar provisório de companheira de lutas, ao lado dele? É assim que o seu coração agradece os benefícios divinos e remunera aqueles que o servem? Quer você uma escrava e despreza uma irmã? Hilda! Hilda! onde está a religião do


Crucificado que você aprendeu? Oh! minha pobre neta, minha pobre!..." Abracei-me, então, em lágrimas, com a velhinha santa e abandonei o antigo ambiente doméstico, vindo em companhia dela para os serviços de "Nosso Lar". Desde essa época, tive em Luciana mais uma filha. Trabalhei, então, intensamente. Consagrei-me ao estudo sério, ao melhoramento moral de mim mesma, busquei ajudar a todos, sem distinção, em nosso antigo lar


terrestre. Constituiu Tobias uma família nova, que passou a me pertencer, igualmente, pelos sagrados laços espirituais. Mais tarde, voltou ele, reunindo-se a mim, acompanhado de Luciana, que veio também ter conosco para nossa completa alegria. E aí tem, meu amigo, a nossa história...


Luciana, contudo, tomou a palavra e observou:


- Não disse ela, porém, quanto se tem sacrificado, ensinando-me com exemplos.


- Que dizes, filha? - perguntou a senhora Tobias, acariciando-lhe a destra.


Luciana sorriu e ajuntou:


- Mas, graças a Jesus e a ela, aprendi que há casamento de amor, de fraternidade, de provação, de dever, e, no dia em que Hilda me beijou, perdoando-me, senti que meu coração se libertara desse monstro que é o ciúme inferior. O matrimônio espiritual realiza-se, alma com alma, representando os demais simples conciliações indispensáveis à solução de necessidades ou processos retificadores, embora todos sejam sagrados.


- E assim construímos nosso novo lar, na base da fraternidade legítima - acrescentou o dono da casa.


Aproveitando o ligeiro silêncio que se fizera, indaguei:


- Mas como se processa o casamento aqui?


- Pela combinação vibratória - esclareceu Tobias, atencioso -, ou então, para ser mais explícito -, pela afinidade máxima ou completa.


Incapaz de sopitar a curiosidade, esqueci a lição de bom-tom e interroguei:


- Mas, qual a posição de nossa irmã Luciana neste caso?


Antes, porém, que os cônjuges espirituais respondessem, foi a própria interessada que explicou:


- Quando desposei Tobias, viúvo, já devia estar certa de que, com todas as probabilidades, meu casamento seria uma união fraternal, acima de tudo. Foi o que me custou a compreender. Aliás, é lógico que, se os consortes padecem inquietação, desentendimento, tristeza, estão unidos fisicamente, mas não integrados no matrimônio espiritual.


Queria perguntar mais alguma coisa; entretanto, não encontrava palavras que revelassem ausência de impertinente indiscrição. A senhora Hilda, contudo, compreendeu-me o pensamento e explicou:


- Fique tranqüilo. Luciana está em pleno noivado espiritual. Seu nobre companheiro de muitas etapas terrenas precedeu-a há alguns anos, regressando ao círculo carnal. No ano próximo, ela seguirá igualmente ao seu encontro. Creio que o momento feliz será em São Paulo.


Sorrimos todos alegremente.


Nesse instante, Tobias foi chamado à pressa, para atender a um caso grave nas Câmaras de Retificação.


Era preciso, desse modo, encerrar a palestra.

(Nosso Lar, cap. 38, André Luiz/Chico Xavier, FEB)

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