A reencarnação – crença na qual o espírito de um morto pode ter uma nova existência em um novo corpo físico – era ensinada na antiga Grécia pelos seguidores do culto de Orfeu e de Pitágoras. |
O filósofo ateniense Platão, que viveu no séc. IV a. C., no período clássico da Grécia, trata do assunto em um conto no livro A República. Aqui traz várias revelações sobre a vida após a morte e a reencarnação, dentre as quais destacamos uma sobre a escolha de uma nova vida, comparando-a com os ensinamentos espíritas sobre o assunto.
Platão, nesse livro, reproduz um conto narrado pelo filósofo Sócrates para os seus discípulos. No conto, Er, o filho de Armenius, foi dado como morto em batalha e levado para casa para ser enterrado. No décimo segundo dia, estando na pira funerária, ele recupera os sentidos e conta para os seus conterrâneos que tinha estado no mundo dos espíritos e recebido a missão de observar esse mundo e revelar para as pessoas o que acontecia após a morte.
Er descreve o começo do processo de reencarnação de um grupo de espíritos. Eles podiam escolher o tipo de vida que gostariam de ter em uma nova existência, dentre as várias opções postas à sua disposição. Um profeta avisava-os de que “O primeiro a quem a sorte couber, seja o primeiro a escolher uma vida a que ficará ligado pela necessidade. (…) A responsabilidade é de quem escolhe. O deus é isento de culpa”.(1)
Adiante, Er discute os tipos de vida que os espíritos podiam escolher. Descreve o seguinte: “a maior parte fazia a sua opção de acordo com os hábitos da vida anterior. Dizia ele que vira a alma que outrora pertencera a Orfeu escolher uma vida de cisne, por ódio à raça das mulheres, porque, devido a ter sofrido a morte às mãos delas, não queria nascer de uma mulher; (...) A seguir a esta, era a (alma) de Agamenon. Também ela, por ódio à raça humana, devido ao que padecera, quis mudar para uma vida de águia.
Depois, a alma de Ulisses, a quem a sorte reservara ser a última de todas, avançou para escolher, mas, lembrada dos anteriores trabalhos, quis descansar da ambição, e andou em volta a procurar, durante muito tempo, a vida de um particular tranquilo; descobriu-a a custo,jazente em qualquer canto, e desprezada pelos outros; ao vê-la, declarou que faria o mesmo se lhe tivesse cabido o primeiro lugar, e pegou-lhe alegremente” (1).
A reencarnação, uma das bases do Espiritismo, foi revelada pelos espíritos superiores através de vários médiuns a Allan Kardec na primeira metade do século XIX. Eles ensinaram que os “Espíritos não ocupam perpetuamente a mesma categoria. Todos se melhoram passando pelos diferentes graus da hierarquia espírita. Esta melhora se efetua por meio da encarnação, que é imposta a uns como expiação, a outros, como missão.
A vida material é uma prova que lhes cumpre sofrer repetidamente, até que hajam atingido a absoluta perfeição moral.(...) Tendo o Espírito que passar por muitas encarnações, segue-se que todos nós temos tido muitas existências e que teremos ainda outras, mais ou menos aperfeiçoadas, quer na Terra, quer em outros mundos” (2).
Diferentemente do descrito no conto, em que o espírito pega um número jogado junto dele por sorte e que permite aos primeiros colocados o privilégio de escolherem, antes dos outros, as melhores amostras de vida colocadas no chão, sem levar em consideração os méritos; o Espiritismo descreve com mais detalhes como ocorre o processo de programação de uma nova existência.
A programação sofre diversas influências. Por exemplo, os traumas psíquicos sofridos em outra existência podem afetar a escolha de uma nova vida, conforme aconteceu com Orfeu e Agamenon. A busca de novas experiências pelo espírito é outra motivação, conforme o caso de Ulisses, que, após ser rei de Ítaca, procurou uma vida de pessoa comum.
Ao contrário das crenças gregas, o Espiritismo não aceita que um homem com consciência de si mesmo e desenvolvido intelectualmente reencarne no corpo de um animal, como um cisne ou águia, como pretendiam Orfeu e Agamenon. Em O Livro dos Espíritos, Kardec expõe que os espíritos rejeitam, e explicam porque “de maneira absoluta, a ideia da transmigração da alma do homem para os animais e reciprocamente”.(3)
O espírito André Luiz, na psicografia de Chico Xavier, traz relatos detalhados de como se processa a reencarnação de espíritos. Ele descreve o processo de escolha de um novo corpo, a ambientação do reencarnante com os futuros pais, a perturbação que antecede a reencarnação, o desenvolvimento do feto e o nascimento.
O conto de Er mostra que os gregos antigos já estavam preocupados em saber como é a vida após a morte, como o espírito sobrevive, mantendo a sua individualidade, como as boas e más ações influenciam no além-tumulo, como escolhem uma nova vida e reencarnam.
Essas preocupações ainda fazem parte da cogitação de milhões de pessoas gerando dúvidas angustiantes e perquirições dolorosas. Esclarecer essas e outras questões sobre a vida após a morte, instruindo e consolando é um dos objetivos do Espiritismo.
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Bibliografia
The Online Library of Liberty – BOOK X. - Plato, Dialogues, vol. 3 - Republic, Timaeus, Critias [1892] - http://oll.libertyfund.org/?option=com_staticxt&staticfile=show.php%3Ftitle=767&chapter=93816&layout=html&Itemid=27
The Republic, http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=10970
(1) A República, Platão, Martin Claret, páginas 313 a 319
(2) O Livro dos Espíritos, Introdução, VI
(3) O Livro dos Espíritos, cap. V, item 222
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