Jaime Facioli
Não há como negar, no mundo globalizado, já alcançado pelos filhos de Deus, caminho que percorremos com sofreguidão, seguindo os ditames da Lei de Evolução. Utilizamo-nos das palavras, como veículo poderoso de convencimento de outrem, para que comunguem nossos pontos de vista. Inquestionavelmente, o poderoso meio de comunicação pela palavra serve aos despropósitos daqueles cujo caráter não ascendeu à elevação moral anelada pelos candidatos à bem-aventurança dos puros de coração. Usam-na para ferir, escrachar, injuriar e mascarar as intenções das pessoas, carregando o veneno mortal da desdita naquele que faz mau uso desse instrumento. Certamente, essa é uma das razões de se encontrar, no livro Seara dos médiuns, pelo Espírito Emmanuel, psicografado por Francisco Cândido Xavier, ed. Feb e, no cap. 14 desse livro, intitulado A carta de Tiago, encontra-se o escólio das três questões que não têm volta: a flecha lançada, a palavra falada e a oportunidade perdida. Pronunciada a palavra e, no sentido lato, também o pensamento, não há maneira de fazer com que ela ou ele retornem. É indispensável pensar muito bem, antes de nos pronunciarmos a respeito de um tema, pois, não podendo fazer com que a palavra volte ou nosso pensamento retroceda, teremos que responder pela nossa ação. Indubitavelmente, é a palavra que reflete, de forma segura, o nível moral em que nos encontramos. Com a palavra se propagam as boas obras e se acende a esperança, nos corações amorosos, despertando a fé. Ao fortalecer a fé vacilante, sustenta-se a paz e, concomitantemente, se má empregada, serve para alimentar o vício e a delinquência. Utilizando a palavra, o professor eleva a mente dos seus aprendizes às culminâncias do saber, ensejando aos seus discípulos descortinarem o mundo belo, colorido e consentido. Usando do verbo, o malfeitor arroja infindável número de vítimas do não vigiar, do não orar e do não ter olhos para ver, para o fosso do crime. Conversando, a mãe educa e dulcifica o filho, apontando-lhe os caminhos da honra e do dever. Com a palavra, maus líderes editam leis espúrias, conduzem os povos às guerras cruentas, permitindo que a boca escancarada da morte ceife vidas preciosas. Na contrapartida do exercício do livre-arbítrio, os bons governantes, sinceramente preocupados com seus comandados e responsabilidades, elaboram discursos de paz e se esforçam por concedê-la. O Divino Rabi da Galileia falou, e o Evangelho surgiu como a Boa Nova que todos aguardavam, sofridos e desalentados. Antes d’Ele, a fim de preparar os caminhos, uma voz se ergueu desde o deserto até as margens do rio Jordão, pregando um novo tempo. Um tempo em que as veredas do Senhor seriam aplainadas, e os homens poderiam ouvir o doce cântico de um Rabi. Nas tardes quentes, nas noites amenas, Jesus serviu-Se da palavra para ensinar as verdades do Pai que está nos céus, para manifestar a Sua vontade generosa e curar enfermos. Com Seu verbo e sua logística incomparável, salvou da morte, por apedrejamento, uma mulher que se equivocara, esquecendo dos seus deveres de esposa. Serviu-Se da palavra e pediu perdão ao Pai para os que O crucificaram e, com a palavra da fé, entregou-Se a Deus. O apóstolo Paulo, pela palavra consciente e esclarecedora, levou as boas novas do Reino de Deus a lugares inimagináveis. O Messias deixava-Se inflamar pela inspiração dos céus, que Seu verbo convertia multidões. Gandhi serviu-se da palavra, para convidar a todos os seus irmãos da Índia a se unirem pelo mesmo ideal; seguindo os passos de Jesus, elegeu a não violência como forma de vencer as cizânias da vida. Martin Luther King Jr. Discursou, em nome da paz, desejando que brancos e negros se sentissem irmãos. Quando a guerra civil devastava o solo americano, o Presidente Lincoln usou da palavra de bom ânimo, para levantar a moral dos soldados abatidos pelas derrotas e pelo abandono que acreditavam sofrer. O verbo é sempre a manifestação da inteligência sadia ou enferma. É a base da escrita. E, toda vez que utilizamos a palavra, semeamos bênçãos ou espalhamos tempestades. Desse modo, ainda que trevas e espinheiros se alonguem junto a nós, governemos a emoção e pronunciemos, sempre, a palavra que instrua, console, ajude ou santifique. Aprendamos a calar toda frase que destrua, porque toda palavra que agride é moeda falsa, no tesouro do coração. Sobre o poder da palavra e a forma de combatê-la, há uma história popular que dulcifica os corações amorosos e nos torna cada vez mais sensíveis ao amor, sublime amor. Conta-se que, certo dia, um homem revoltado criou um poderoso e longo pensamento de ódio, colocou–o numa carta rude e malcriada e mandou-a para seu chefe da oficina de onde fora despedido. O pensamento foi vazado em forma de ameaças cruéis. E, quando o diretor do serviço leu as frases ingratas que o ofendiam, acolheu-as, desprevenidamente, no próprio coração, e tornou–se furioso, sem saber a razão. Encontrou, quase de imediato, o subchefe da oficina e, a pretexto de enxergar uma pequena peça quebrada, desfechou sobre ele a bomba mental que trazia consigo. Foi a vez de o subchefe tornar-se neurastênico, sem se dar conta do motivo. Abrigou a projeção maléfica no sentimento, permaneceu amuado várias horas e, no instante do almoço, ao invés de alimentar-se, descarregou na esposa o perigoso dardo intangível. Tão só por ver um sapato imperfeitamente engraxado, proferiu dezenas de palavras chulas; sentiu-se aliviado, e a mulher passou a asilar no peito a odienta vibração, em forma de cólera inexplicável. Repentinamente transtornada pelo raio que a ferira e que, até ali, ninguém soubera remover, encaminhou-se para a empregada que se incumbia do serviço de calçados e desabafou. Com palavras indesejáveis, inoculou-lhe no coração o estilete invisível. Agora era uma pobre menina quem detinha o tóxico mental. Não podendo despejá-lo nos pratos e xícaras ao alcance de suas mãos, em vista do enorme débito em dinheiro que seria compelida a aceitar, acercou-se de velho cão, dorminhoco e paciente, e transferiu-lhe o veneno imponderável, num pontapé de largas proporções. O animal ganiu e disparou, tocado pela energia mortífera e, para livrar-se desta, mordeu a primeira pessoa que encontrou na via pública. Era a senhora de um proprietário vizinho que, ferida na coxa, se enfureceu, instantaneamente, pela vibração amaldiçoada, possuída pela força maléfica. Em gritaria desesperada, foi conduzida a certa farmácia; entretanto, deu-se pressa em transferir ao enfermeiro que a socorria a vibração indesejada. Crivou-o de xingamentos e esbofeteou-lhe o rosto. Rapaz muito prestativo, de calmo que era, converteu-se em fera verdadeira. Revidou os golpes recebidos com observações ásperas e saiu, alucinado, para sua residência, onde a velha e devotada mãezinha o esperava para a refeição da tarde. Chegou e descarregou sobre ela toda a ira de que era portador. – Estou farto! – bradou. – A senhora é culpada dos aborrecimentos que me perseguem. Não suporto mais esta vida infeliz. Fuja da minha frente. O rapaz fez mau uso da palavra e pronunciou nomes terríveis. Blasfemou, gritou colérico, qual louco. A velhinha, porém, longe de agastar-se, tomou-lhe as mãos e disse-lhe, com naturalidade e brandura: – Venha cá, meu filho. Você está cansado e doente. Sei a extensão de seus sacrifícios por mim e reconheço que tem razão para lamentar-se. No entanto, tenhamos bom ânimo. Lembremo-nos de Jesus. O uso que O Divino Jardineiro fez das palavras dulcificadas. Afinal, tudo passa, na Terra. Não nos esqueçamos do amor que o Mestre nos legou. Abraçou-o, comovida, e afagou-lhe os cabelos. O filho demorou-se a contemplar-lhe os olhos serenos e reconheceu que havia, no carinho materno, tanto perdão e tanto entendimento que começou a chorar, pedindo-lhe desculpas. Houve, então, entre os dois, uma explosão de íntima alegria. Jantaram felizes e oraram, em sinal de reconhecimento a Deus. A projeção destrutiva do ódio morrera, ali, dentro do lar humilde, diante da força infalível do sublime amor.
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