Eliseu Mota Júnior
A invasão dos sonhos de uma pessoa, para extrair ideias do seu inconsciente ou ali inserir uma ideia devastadora, para que o sonhador a concretize, ao despertar, é a trama central do filme A origem, no qual um espião extrai informações secretas dos sonhos de importantes pessoas e depois as vende a um preço altíssimo. Em uma trama paralela, ele é acusado pela morte da esposa e foge, porque se considera inocente. Vivendo no estrangeiro, ele aceita uma missão quase impossível, que é a inserção de uma ideia no inconsciente do herdeiro de uma grande potência. No caso de êxito, o espião receberá não apenas o pagamento em dinheiro, como poderá retornar ao seu lar, livre de qualquer acusação e rever seus filhos.
No filme, com o auxílio de efeitos especiais impressionantes, a invasão de sonhos é um espetáculo magnífico, sobretudo porque o espião e sua equipe vão induzindo a vítima a passar de um sonho para outro, mergulhando, cada vez mais fundo, no seu inconsciente, porque é só ali, onde a defesa do sonhador é praticamente nula, que a ideia contrária à sua vontade poderá ser plantada.
O enredo mescla uma pequena dose de realidade com um tonel de ficção. De fato, a ciência considera o sonho uma experiência subjetiva que emerge na consciência, durante o sono, como resultado de uma atividade mental inconsciente. Assim, os aparelhos que hoje permitem acessar o cérebro de alguém que esteja sonhando resultam de combinações sofisticadas, como a magnetoencefalografia e a ressonância magnética funcional. Tais técnicas requerem aparelhos enormes, caríssimos e, ainda assim, eles não resolveriam o problema, porque esbarrariam em grandes limitações.
De qualquer modo, o filme comprova muitos princípios espíritas, principalmente ao mostrar que os personagens, induzidos em sono, participam ativamente dos sonhos, usando corpos idênticos aos que permanecem dormindo, com a diferença de que são etéreos, uma vez que suas fantásticas aventuras acontecem em outras dimensões. De acordo com a teoria espírita, o sono é uma das espécies do gênero emancipação da alma, fenômeno que ocorre quando, pela suspensão das atividades corporais, ela se acha mais ou menos desprendida da matéria e penetra no mundo extracorpóreo, usando seu corpo perispiritual. Os sonhos são efeitos dessa relativa independência, da qual remanescem as singulares imagens do que se passa ou que se passou durante esse período.
No que se refere, especificamente, à possibilidade ou não da invasão de sonhos, para extrair ou inserir ideias, no inconsciente do sonhador, a técnica espírita difere daquela parafernália ficcional, utilizada no filme. De fato, algumas vezes é possível modificar as ideias de uma pessoa, em estado de vigília, atuando-se sobre o seu Espírito, durante o sono. Como, nesse ínterim, a alma não está presa ao corpo material por laços tão estreitos, ela se mostra mais acessível às impressões morais, que podem influir na sua conduta, ao despertar.
Na Revista Espírita de julho de 1865, em um ensaio com o sugestivo título de Teoria dos sonhos, Allan Kardec relata um episódio interessante e que bem ilustra esta questão. Em resumo, diz ele que um médium sonâmbulo descreveu, com exatidão, o apartamento onde o corpo de uma jovem dormia, em Lyon, enquanto seu Espírito, atraído pelo pensamento, estava presente na mesma sala, em Paris, onde se encontravam o sonâmbulo e a mãe da moça. Acrescentou que ela via e ouvia o que se passava e depois até beijou sua mãe. O médium, concluindo, explicou que tais sonhos inconscientes proporcionam sensações indefiníveis de contentamento e de felicidade, das quais a pessoa não se dá conta.
De tudo isso, fica evidente que o Espírito encarnado, recebendo instruções, durante o sono e outros estados de emancipação da alma, pode sofrer transformações importantes, capazes mesmo de promover mudanças nas suas aptidões. No mais, a invasão de sonhos, para extrair ou inserir ideias – pelo menos, nas condições do filme –, não passa de criação mirabolante da fértil imaginação dos cineastas.
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