| | | |
Há um capítulo no livro Obras Póstumas, de Allan Kardec, A Vida Futura, que deveria ser cuidadosamente estudado e sobre o qual nós, espíritas, deveríamos refletir muito profundamente, a fim de entendermos, tanto quanto possível em nosso presente estágio, a filosofia de vida que nos oferece o Espiritismo no sentido de facilitar a nossa caminhada evolutiva.
Deolindo Amorim, trabalhador e escritor espírita, profundo conhecedor e defensor da Doutrina Espírita, afirma em seu livro O Espiritismo e os Problemas Humanos: "O Espiritismo é, para nós, uma filosofia de vida, não é simplesmente uma crença."
No capítulo citado, Kardec nos adverte: "Por muito sólida que seja a crença na imortalidade, o homem não se preocupa com a sua alma senão de um ponto de vista místico." Realmente, para a grande maioria das criaturas, a alma é como algo além da nossa condição de encarnados, transcendente a nós mesmos, e com cuja situação devemos nos preocupar somente após a morte física; a existência de alma está condicionada, muito frequentemente, ao fato da criatura possuir algum tipo de crença religiosa, transformando-a assim em alguma coisa mística.
De um modo geral, isso é bem verdadeiro e comum, mesmo em nosso meio espírita. Dificilmente aqui, no mundo físico, nos entendemos como espíritos, tanto que muitas vezes usamos a expressão "eu e o meu espírito", sem nos lembrarmos que o eu é o espírito!
Costumamos nos preocupar com o mundo espiritual, em como estaremos no retorno à erraticidade, se bem ou não, sem nos lembrarmos de que as condições da nossa vida futura estão sendo firmadas aqui e agora, a cada segundo, a cada pensamento, a cada atitude de nossa parte, visto que de há muito, encarnados ou desencarnados, somos os "seres inteligentes da criação" (OLE q.76), possuidores de discernimento, portadores de livre-arbítrio, ou seja, de capacidade de escolha.
Voltamos a Deolindo Amorim, agora em seu livro Análises Espíritas, capítulo 19: "Embora se preocupe diretamente com a vida futura ou extraterrena, não deixa o Espiritismo, todavia, de cogitar do bem-estar humano, discutindo os aspectos fundamentais da questão social" e, em seu livro anteriormente citado, no capítulo Definição e Opção, Deolindo ainda enfatiza: "Se a Doutrina é assim, se ela nos predispõe ao trabalho de ajuda moral e material, sem qualquer discriminação, está bem visto que também se interessa pelo mundo, pelo homem e pelas suas condições terrenas."
Consequentemente depreendemos de tantos ensinamentos que a nossa vida futura está intimamente ligada à nossa existência presente, considerando-se que cada decisão, cada escolha, cada gesto, cada palavra, cada pensamento, projeta instantaneamente no futuro uma conquista ou um compromisso. A lei de causa e efeito, uma das ferramentas da lei de progresso, é inevitável e intransferível - não posso dizer imutável, pois, sob novas condições, dadas as circunstâncias, que não são regidas pela fatalidade, mas sim pelo determinismo, pode-se atenuar o efeito mediante um procedimento mais esclarecido, ou acentuá-lo se insistirmos em posturas equivocadas.
Por isso Kardec no capítulo em estudo ainda afirma: "O homem não se preocupará com a vida futura senão quando vir nela um fim claro e positivamente definido, uma situação lógica, em correspondência com todas as suas aspirações, que resolva todas as suas dificuldades do presente e em que não se lhe depare coisa alguma que a razão não possa admitir." Efetivamente, ao nível mediano de evolução em que ora nos situamos de um modo geral, é necessário compreendermos o porquê e o para que de determinado comportamento; é necessário que a situação que estamos vivenciando tenha um objetivo ao alcance do nosso entendimento e seja compatível com os nossos anseios de felicidade e prosperidade moral e material - inteiramente legítimos desde que não firam a lei maior de justiça; necessário é que o conhecimento da vida futura como uma realidade ajude o homem a equacionar as dificuldades de sua vida presente ao perceber que é no presente que estabelece as condições melhores, ou piores, para a vida futura, em função da boa, ou má, utilização de seu livre-arbítrio.
Somos senhores absolutos do nosso livre-arbítrio, mesmo quando não estamos dispostos a reconhecê-lo, ou nos julgamos frágeis para exercê-lo. Os Espíritos amigos nos asseguram que, mesmo existindo o arrastamento, este não é irresistível (OLE qs. 644, 645 e 845); por mais envolvidos, por maiores sejam as dificuldades e os obstáculos a enfrentar, a nossa vontade é soberana - o que muitas vezes ainda não sabemos é como utilizá-la de forma adequada (OLE q.909), tanto que Allan Kardec, em suas conclusões ao final do Livro dos Espíritos, item VI, nos afiança: "A grande força do Espiritismo está no apelo que faz à razão e ao bom-senso".
Nenhum comentário:
Postar um comentário