Evolução científica e religiosa
Cairbar Schutel
Publicado na RIE em setembro de 1925
A permanência das doutrinas rotineiras não permitirá à humanidade dar um passo para a perfeição.
No mundo científico, como no mundo religioso, com suas áreas restritas e limites preconizados pelos métodos nimiamente adstritos às aquisições arcaicas, os investigadores se perdem num labirinto em que os próprios princípios que formam suas bases se convertem em embaraços e inconcludências, sem que os mais rudimentares fundamentos da psicologia lhes apareça mesmo na penumbra.
Por mais que se doutrine ou dogmatize, as investigações psico-fisiológicas, em face das religiões e das ciências oficializadas, são incapazes de formar um corpo unitário de doutrina.
A fisiologia pregoando o materialismo, assim como as religiões proclamando o milagre nas manifestações de caráter anímico e espírita, prejudicam-se e se constituem barreiras inexpugnáveis para o crescimento do Ideal.
A ciência parece ter caminhado muito, entretanto não deu ainda um passo no campo espiritual que há quase um século tem sido submetido concomitantemente à sua observação.
E não se digna que algo lhe tem faltado para que ela tome parte na renovação que o Espiritismo vem fazendo desde a sua manifestação no mundo, pois até aparelhos constatadores da força-psíquica foram construídos, demonstrando a existência de inteligências extraterrenas que por eles têm provado a sua ação.
E a ciência como a religião não devem estacionar, visto não poderem conciliar estas duas proposições: saber ou não saber.
Sem dúvida o absoluto não cabe no limitado, mas o progresso não conhece fronteiras; a sua ação é constante, persistente, infinita.
Limitar a verdade aos conhecimentos adquiridos por uma centena de doutos é o mesmo que prender a um poste uma águia, privando-a dos seus elevados surtos.
A experiência diuturna tem demonstrado que a ciência e a religião oficializadas não podem absolutamente solucionar o problema do eu, o motivo da vida com suas peripécias empolgantes.
Além disso, os fatos que são tudo, fatos brutais, incoercíveis, eloquentes, inutilizam todos os conhecimentos que foram circunscritos em área determinada.
É indispensável que os pensadores presos ao grilhão da ciência e da religião oficial rompam o círculo dessas ideias obsidentes, nutridas, sem dúvida, à custa das melhores faculdades do seu talento e se tornem pioneiros de uma nova região de trabalhos e de buscas necessárias à realização do progresso humano.
Quando há setenta anos(1) Allan Kardec lançou à publicidade os fundamentos de uma nova Gênesis que deveria modificar o estado dos conhecimentos humanos impregnados do maravilhoso e do dogma, inscreveu no frontispício da sua obra o seguinte desafio: “A ciência é chamada a constituir a Gênesis, segundo as leis da natureza”.
* * * *
A solução do problema do destino humano, como já se tem dito, é a que mais importa, pois o seu inquérito não pode deixar de interessar a todos os espíritos. E essa tarefa está entregue tanto à ciência como à religião que têm como máximo dever investigar todos os fatos que lhes são apresentados, a fim de erguerem sobre essa base sólida novas edificações filosóficas destinadas a modificarem os preconceitos do passado.
A constituição da nova Gênesis há de ter como ponto de partida a existência do princípio anímico e sua sobrevivência à morte corporal, sem o que seria proclamado o neantismo, ou seja, a queda de todas as instituições e consequentemente a desagregação e destruição da família humana.
Pelo estudo indutivo do Animismo e do Espiritismo, não podem deixar, estas duas formas do progresso — Ciência e Religião —, até aqui antagônicas, de chegar a um entendimento conciliatório, o que lhes daria um aspecto valiosíssimo, uma vantagem moral extraordinária, para o desempenho da missão a que se avocaram com direitos.
A compreensão nítida da Vida lhes colocaria numa esfera propícia de evolução e os seus propugnadores ou pioneiros encher-se-iam de estímulo intenso para proclamarem, baseados em fatos concludentes, a necessidade do nosso progresso moral para melhoria da nossa situação futura.
Ao passo que relegados os fenômenos como coisa de pouca importância, postas à margem as valorosas contribuições que esses fatos proporcionam, torna-se absolutamente impossível vencer o abandono e o desprezo em que é tido por todos o estudo preparatório da individualidade psíquica, cujo entendimento no período de transição e lutas em que nos achamos, nos conduzirá necessariamente à melhoria das situações futuras.
Nenhum outro estudo traz consigo a vantagem moral que é o que constitui assunto desta REVISTA, tanto mais que ele não se funda unicamente num fato isolado, mas lhe servem de base os mais numerosos e diferenciados fenômenos. Ainda mais, não se trata de uma hipótese meramente pessoal, mas de milhares de votos ponderados por mentalidades sadias, cuja proficiência se deixa ver nos mais profundos trabalhos científicos. Além disso esses fatos são constatados, formando um complexo e latíssimo montão de fatos positivos que nenhuma objeção conseguiu destruir.
Concluamos estas linhas lembrando que a natureza na expressão muda e eloquente da manifestação dos seus fenômenos insiste para que estudando e pesquisando nos assenhoremos dos seus segredos.
Deixemos de lado as simplistas negações ou conjeturas teóricas, e agora que a atenção dos físicos e dos fisiologistas está voltada para uma nova ordem de fenômenos, que tem como intermédio o corpo humano, estudemos e trabalhemos, porque quando outros frutos não se colhessem de tais pesquisas, não deixariam de aparecer aqueles já bem compensadores que resolvem o problema da Vida e nos dão a certeza da Imortalidade.
1- Em abril/2010 completou 153 anos (18/abril/1857).
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