Ninguém pode dizer que Judas o escreveu, mas o seu Evangelho ressurge em Basileia
Depois de há dois mil anos ter semeado a discórdia entre os primeiros cristãos, o Evangelho Segundo Judas, com o nome do apóstolo que traiu Jesus, veio à lume na Suíça, onde está a ser traduzido por uma equipe dirigida por Rudolf Kasser, da Universidade de Genève.
O manuscrito de papiro redigido em copta, antiga língua dos cristãos do Egito, deverá surgir em alemão, inglês e francês no espaço de um ano, segundo a Fundação Maecenas para a Arte Antiga, de Basileia. "Acabamos de receber os resultados dos testes e chegamos à conclusão de que o texto é ainda mais antigo dos que pensávamos, remontando a um período compreendido entre o princípio do século III e o princípio do IV", explicou Mario Jean Roberty, diretor deste organismo.
A existência do Evangelho Segundo Judas, cujo original está provavelmente escrito em grego, foi atestado pelo primeiro bispo de Lyon, Santo Irineu, que, no meio do século II, o denunciou num texto contra as heresias. "É a única fonte clara que permite saber que o Evangelho existiu" - diz Mario Jean Roberty, que não se quis pronunciar sobre o conteúdo do texto antes da sua publicação.
"Ainda não quisemos revelar o lado excepcional daquilo que temos entre mãos", acrescentou. Segundo a tradição, Judas entregou Jesus aos romanos que o crucificaram. Arrependido, “ter-se-ia enforcado “Não se enforcou, porém, no seu próprio Evangelho”, ironiza o especialista.” O mistério permanece no que se refere aos autores da obra, descoberta no Egito há cerca de meio século e comprada pela fundação suíça em 2001."
Ninguém pode afirmar que Judas em pessoa o terá escrito, refere Roberty, acrescentando que os outros evangelhos não saíram provavelmente também da pluma dos supostos autores.” No concílio de Nicéia (Turquia), reunido em 325 por iniciativa do primeiro imperador romano cristão, Constantino, a Igreja nascente considerou apenas os quatro evangelhos como transmissores dos ensinamentos de Cristo.
Somente os textos atribuídos aos evangelistas Marcos, João, Lucas e Mateus se mantiveram. Uma trintena de outros textos foi afastada, por serem considerados "inconciliáveis com aquilo que Constantino queria manter como doutrina política", salienta Roberty.
Contrastando com eles, o texto de Judas "põe em causa princípios políticos da doutrina cristã, permitindo uma certa reabilitação da personagem: "Judas é uma das justificações do cristianismo na sua visão anti-semita", diz.
Diário de Notícias.
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